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A diversidade na Igreja

"A casa do meu Pai tem muitas moradas", diz-nos Jesus no evangelho.

A unidade na diversidade não é sempre aparente na Igreja enquanto povo de Deus, mas é uma realidade em Deus e uma presença na fé cristã desde a sua origem. A Palavra de Deus não é partidária, elitista e exclusiva. O Reino de Deus é como uma árvore que estende os ramos para dar abrigo a todos os pássaros do céu. Cristo não morreu na cruz para salvar uma mão cheia de cristãos. Até o Deus Uno encerra em si o mistério de uma Trindade.

A Palavra de Deus é inequívoca e só pode levar à desinstalação, à abertura ao outro, e a recebê-lo e amá-lo enquanto irmão ou irmã. Ninguém fica de fora, nem mesmo - se tivessemos - os inimigos.

Muitos cristãos crêem nesta Igreja, nesta casa do Pai, corpo de Cristo, templo do Espírito Santo. Mas como esquecer que muitos se sentem "de fora" por se verem rejeitados, amputados e anulados, e afastam-se por ninguém lhes ter mostrado que há um lugar para cada um, com a totalidade do seu ser?

Um blogue para cristãos homossexuais que não desistiram de ser Igreja

Porquê este blogue?

Este blogue é a partilha de uma vida de fé e é uma porta aberta para quem nela quiser entrar. É um convite para que não desistas: há homossexuais cristãos que não querem recusar nem a sua fé nem a sua sexualidade. É uma confirmação, por experiência vivida, que há um lugar para ti na Igreja. Aceita o desafio de o encontrares!

Este blogue também é teu, e de quem conheças que possa viver na carne sentimentos contraditórios de questões ligadas à fé e à orientação sexual. És benvindo se, mesmo não sendo o teu caso, conheces alguém que viva esta situação ou és um cristão que deseja uma Igreja mais acolhedora onde caiba a reflexão sobre esta e outras realidades.

Partilha, pergunta, propõe: este blogue existe para dar voz a quem normalmente está invisível ou mudo na Igreja, para quem se sente só, diferente e excluído. Este blogue não pretende mudar as mentalidades e as tradições com grande aparato, mas já não seria pouco se pudesse revelar um pouco do insondável Amor de Deus ou se ajudasse alguém a reconciliar-se consigo em Deus.

segunda-feira, 13 de junho de 2011

Carta aberta dos cristãos LGBT para Bento XVI

foto: Teleny
O fórum europeu de grupos cristãos LGBT elaborou uma carta aberta a Bento XVI que apela ao respeito pelos direitos humanos e o respeito pela verdadeira integridade das pessoas LGBT.

Em 10 de Junho de 2011, o Fórum Europeu de grupos cristãos de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transgéneros e Transexuais redigiu uma carta ao Papa Bento XVI apelando ao respeito pelos direitos humanos e da verdadeira "integridade pessoal" das pessoas LGBT. O Fórum representa 44 grupos cristãos de 23 países europeus.

Com esta carta, o Fórum pede ao Papa que uma posição clara contra a violência homofóbica e contra qualquer pressão das autoridades religiosas se submeter a "terapia reparadora", que muitas vezes causam danos psicológicos significativos.

A carta foi apresentada ao público na Conferência Europeia "As pessoas homossexuais e transexuais e as igrejas cristãs na Europa", organizado por ocasião da EuroPride Roma. A conferência, organizada pelo grupo "Nova Proposta", em Roma, com o apoio de grupos cristãos em colaboração com o Fórum Europeu, teve como palestrante John McNeil, um dos fundadores da teologia gay, excluído pela ordem dos jesuítas por causa da sua homossexualidade.

Segue-se uma tradução livre para português do documento:

Uma carta aberta dos cristãos LGBT para Bento XVI ter em atenção os direitos humanos

Santo Padre, nós apelamos que condene a violência contra Gays, Lésbicas, Bissexuais, Transgéneros e Transexuais (LGBT) e pedimos a colaboração de Sua Santidade para a descriminalização dos atos homossexuais no mundo.

O silêncio de Sua Santidade muitas vezes é interpretado por pessoas que cometem atos de violência, tortura e assassinato como um parecer favorável às suas ações.

Por exemplo, em janeiro deste ano, David Kato, um ativista na luta pelos direitos LGBT, foi brutalmente assassinado no Uganda.

A violência, tortura e assassinato contra as pessoas LGBT são frequentes em diferentes partes do mundo e que muitas vezes os seus actores parecem convencidos que estão a respeitar a vontade da Igreja Católica .

Esta convicção é reforçada pelo fato de que em dezembro de 2008, a Santa Sé se recusou a apoiar a Declaração da ONU sobre orientação sexual e identidade de género.

A Declaração contém um parágrafo que apela a todos os Estados a assegurar que a orientação sexual ou identidade de género não podem ser em qualquer circunstância, a base para a aplicação de sanções penais, incluindo execuções, prisões ou detenções.

Apelamos pois a Sua Santidade, que forneça informações claras a todos os cristãos sobre as passagens bíblicas que são usados ​​para tentar justificar esses atos abomináveis.

Tal como as medidas a favor da escravidão, os versos usados para apoiar o assassinato de pessoas envolvidas em atividades sexuais com pessoas do mesmo sexo não devem ser interpretados literalmente.

Existe ainda uma forma de pressão de alguns membros do clero da Igreja Católica de Roma para que os cristãos LGB se submetam a "terapias reparadoras" para mudar a sua orientação sexual. Esta estratégia da Igreja e o pedido para que as pessoas LGBT vivam na castidade são a causa de muitas tragédias, incluindo suicídios e estados graves de depressão entre aqueles que heroicamente tentam observar e seguir os ensinamentos da Igreja.

Além disso, de acordo com estudos recentes da psiquiatria e da psicologia, a orientação sexual não pode ser mudado e essas tentativas muitas vezes resultam em graves danos psicológicos. Além disso, uma vida de castidade não pode ser forçada aqueles que não se sente dentro de si esta vocação.

Para os cristãos LGBT não pode ser negado o direito fundamental de um relacionamento amoroso, independentemente do sexo da pessoa amada.

Porque a ciência provou que a homossexualidade é uma variante da sexualidade, pedimos esta evidência científica esteja incluída nos ensinamentos da Igreja.

Assim, solicitamos que Sua Santidade não dê mais como uma indicação de que as pessoas homossexuais devem submeter-se ao tratamento, mas sim que eles têm direito a uma vida que também inclui uma relação amorosa como um sinal de lealdade.

Os benefícios sociais e pessoais disto são: uma vida feliz, saúde mental, a capacidade de dar o seu melhor no trabalho e em ajudar os outros.

Viver de outra forma, muitas vezes se transforma numa triste existência com uma série de tratamentos psicológico e psiquiátrico desnecessários, perda da fé em Deus, na humanidade e no amor, como evidenciado pelas cartas frequentes e bons exemplos de cristãos LGBT.

Mundialmente, muitas lésbicas, gays, transgéneros e transexuais vivem relações baseadas no amor, na fidelidade e na assistência mútua.

Assim como em relações heterossexuais maduras, o amor é essencialmente uma experiência espiritual e também física. Infelizmente, por causa do preconceito e da desinformação, muitas pessoas associam o conceito de homossexualidade só o amor físico.

No que diz respeito à declaração de Sua Santidade, em dezembro de 2008, sobre a necessidade de proteger a humanidade como o ecossistema de uma floresta tropical, após a mesma metáfora, podemos dizer que as pessoas LGBT são menos numerosas, mas uma espécie que se encontra constantemente no ecossistema e, como sabemos, cada espécie é importante e necessária para assegurar um equilíbrio criado por Deus.

Pedimos-lhe que reconsidere a posição da Igreja sobre as relações entre as pessoas do mesmo sexo e sobre pessoas transexuais, além de apoiar a aceitação e bênção destas relações no seio da Igreja.

Fazemos um apelo a Sua Santidade para que deixe de exercer pressão sobre os católicos para votarem contra leis que reconheçam as relações entre pessoas do mesmo sexo.

Relações entre pessoas do mesmo sexo ou com pessoas transexuais não são um perigo para a existência da família tradicional. Pelo contrário, vêem apoiar e reforçar os valores da família e do casamento. As pessoas LGBT representam apenas uma pequena percentagem da população, número que permanece constante ao longo dos tempos.

A experiência de não aceitação de jovens LGBT por parte de suas famílias e da Igreja, quase sempre leva a problemas no desenvolvimento de suas personalidades. As consequências são muitas vezes dramáticas e podem resultar, por exemplo, em tentativas desesperadas para entrar em casamentos heterossexuais, para mascarar a sua orientação sexual ou a escolher a vida religiosa, mesmo sem vocação.

Tendo em conta os motivos que temos apresentado, compreende-se como criar ambiente seguro e acolhedor, permitindo que as pessoas LGBT sejam elas próprios, é importante para a sociedade em geral.

O Catecismo da Igreja Católica diz que os homossexuais devem ser tratados com compaixão, respeito e sensibilidade. Respeito e sensibilidade deve ser concedido a todos, independentemente da orientação sexual ou identidade de género. Se fosse realmente assim, a compaixão não seria necessária. Os comportamentos e pontos de vista homofóbicos são particularmente dolorosos quando agitados por aqueles que se afirmam cristãs, seja seculares ou religiosos, e certamente não são uma forma de respeito.

Deus abençoe a Sua Santidade

Berlim, 7 de maio de 2011

Diane Xuereb (Holanda / Malta) - Dr. Michael Brinkschröder (Alemanha)

(Co-Presidentes dos Grupos do Fórum Europeu de Cristãos Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transgéneros e Transexuais em nome dos grupos membros)



Mais informações em: www.euroforumlgbtchristians.eu
in Portugalgay

Há espaço para a Cultura no contexto da Crise Financeira?

fotografia do espectáculo
Paixão de São João Hospitaleiro,

 uma produção do Teatro Nacional D. Maria

Cultura é essencial na crise
O diretor do Secretariado Nacional da Pastoral da Cultura considera que a cultura emerge como elemento fundamental na época de crise que Portugal está a viver.

«A cultura não é uma questão de dinheiro, mas dos valores e do núcleo estruturante daquilo que somos», frisou o padre José Tolentino Mendonça em declarações à Rádio Vaticano.

«Precisamente porque a época é de crise e dificuldades enormíssimas, precisamos de lembrar uns aos outros aquilo que é essencial. E a cultura ajuda-nos a descobrir o que é o mais importante», salientou.

O responsável reconhece que o discurso «vigoroso e inspirador» proferido pelo papa Bento XVI a 12 de maio de 2010 no Centro Cultural de Belém, em Lisboa, «trouxe um ânimo novo à Pastoral da Cultura em Portugal».

«A frase final com que ele acabou o seu discurso – “fazei coisas belas mas sobretudo transformai as vossas vidas em lugares de beleza” – é um desafio que cada um traz no seu coração como uma espécie de emblema e caminho.»

O poeta e biblista defende que «a cultura tem de ser não só um lugar esporádico da beleza, mas sobretudo um lugar onde a vida das mulheres e dos homens se torna a obra-prima e o lugar da afirmação do sentido e da epifania de Deus».

Referindo-se ao festival de cinema Festroia, que decorre em Setúbal entre 3 e 12 de junho, o responsável recorda que o certame «tem uma ligação histórica com a Igreja Católica».

«Alguns dos seus fundadores vinham da militância católica, que era também cultural», assinalou, lembrando que «em Portugal houve pessoas que tiveram uma paixão enorme pela divulgação, debate e exibição do melhor cinema, geração essa que está na origem do Festroia».

«Depois de se ter achado que o cinema ia morrer, hoje assistimos ao renascimento do interesse e ao aumento dos públicos, pelo menos em Portugal. O cinema tornou-se um espelho muito grande para perceber a condição humana e a cultura do nosso tempo, ao mesmo tempo que é um lugar muito especial, uma espécie de observatório, para traduzir os grandes valores éticos e da procura espiritual», afirmou.

A Comissão Episcopal da Cultura, Bens Culturais e Comunicações Sociais está a «tentar renovar a presença da Igreja no mundo do cinema», prestando «uma atenção muito grande às iniciativas que existem em Portugal», nomeadamente com a «presença em festivais de cinema e através do diálogo com criadores».
Por outro lado, a Comissão «acompanha e sinaliza o melhor que se pode ver, valorizando a crítica cinematográfica, que durante anos esteve ausente», prioridade que a Igreja vê como um “serviço” para «ajudar a fazer uma interpretação de alguns dos mais importantes filmes».

Os secretariados nacionais da Pastoral da Cultura e das Comunicações Sociais da Igreja marcam presença desde há dois anos no IndieLisboa, festival internacional de cinema independente, e publicam semanalmente críticas sobre obras da Sétima Arte.

Rádio Vaticano / Rui Martins
© SNPC | 11.06.11 

Concerto de Música Renascentista na Praça de Londres

O Banquete

Um concerto de música Renascentista do grupo IL DOLCIMELO, com direcção de Isabel Monteiro
Local: Auditório da ig. S. João de Deus, Praça de Londres, Lisboa

18 de Junho de 2011 às 17h, com Entrada Livre

O simples e o complexo

Há uma estação no nosso caminho em que o simples e o complexo convivem numa harmonia que nos ajuda a perceber mais profundamente a promessa profética de que o lobo e o cordeiro passearão juntos. A verdade é que, por muito tempo, olhamos para essas realidades em contraposição. Orientamos a nossa vida no desejo de uma coisa ou de outra, numa visão balizada, tranquilamente dicotómica, por acreditarmos que o simples e o complexo são coisas bem distintas.

À primeira vista parece que fomos criados para verdades simples e só essas respondem cabalmente às expectativas do coração humano. Uns dirão que a razão disso repousa unicamente na nossa incurável necessidade de segurança, e que verdadeiramente nada é simples, nada se colhe até ao fim num vislumbre imediato, e que o caminho que todos fazemos é do simples (que tem de ser deixado) para alcançar o complexo (que é o fatal ponto de chegada). E dão como exemplo a infância, a idade das evidências. À medida que crescemos essas evidências empalidecem, desdobram-se, diferenciam-se, entreabrem-se, interrogam-se, dividem-se. O que parecia simples escapa-nos, num processo de complexificação que não dominamos completamente e que, em grande medida, acaba por se nos impor. Creio, porém, que a experiência de que o essencial é simples, e que de modo ainda mais simples se deixa acolher, nos acompanha até ao fim. Mas também sei que, como existe uma conversão do coração ao modo simples que a vida tem de se exprimir (pelo menos, em certas horas), precisamos de trabalhar o nosso coração para aceitar, como condição de autenticidade, a dicção complexa da vida.

Recordo aquela frase que Paulo de Tarso cunhou: «agora vemos como num espelho, e de maneira confusa». Isto é, todas as visões são provisórias e o nosso olhar não é senão  chamado à itinerância. O problema não é que o que nos tinham prometido ser simples depois se torna, sem aviso, complexo. Ou que o que esperávamos complexo se revela, desconcertantemente, simples. É necessário compreender, com humildade, que o problema não é da realidade, mas do modo como lidamos com ela. A questão é a da aprendizagem que o nosso olhar faz ou não faz do real.

Para quem a quiser ouvir, a vida lança-nos o desafio (a sugestão, a prece) de um amor sem posse. Não é o que sabíamos o mais importante, mas o que vamos sabendo. Não é o conhecimento armazenado de um dia que nos pode servir de mapa, mas a meditação do acontecer. Somos convocados para peregrinar, para aferir a profundidade no movimento, para vislumbrar através da incessante deslocação aquilo que permanece. O nosso olhar nem sempre aceita que é pobre, mas quando aceita, percebe finalmente aquilo que está dito num verso de Rainer Maria Rilke e em tantos outros lugares: «A pobreza é um grande brilho que vem de dentro...».

São de sabedoria as palavras do místico São João da Cruz: «Para chegares a saborear tudo,/não queiras ter gosto em coisa alguma.//Para chegares a possuir tudo,/não queiras possuir coisa alguma.//Para chegares a ser tudo,/não queiras ser coisa alguma.//Para chegares a saber tudo,/não queiras saber coisa alguma.//Para chegares ao que queres,/hás de ir por onde não queres.//Para chegares ao que não sabes,/hás de ir por onde sabes.//Para ires ao que não possuis,/hás de ir por onde possuis.//Para chegares ao que não és,/hás de ir por onde és».

José Tolentino Mendonça
In Diário de Notícias (Madeira)
publicado in SNPC

domingo, 12 de junho de 2011

Horto Sereníssimo

uma das mais belas páginas de música dedicada à Virgem.

O vos omnes

In Paradisum

mais uma obra do Eurico Carrapatoso, do "Requiem à memória de Passos Manuel"

alleuia do Salmo CL

Entrevista a Eurico Carrapatoso

foto de Pascal Renoux

Eurico Carrapatoso e o insondável
Como reagiu quando lhe foi anunciado que a Igreja Católica em Portugal, através do Secretariado Nacional da Pastoral da Cultura, o distinguiu com o prémio "Árvore da Vida - Padre Manuel Antunes"?
Senti-me emocionado. O P. José Tolentino de Mendonça, poeta e pensador que tanto admiro, usou o telefone do meu querido amigo e mestre compositor João Madureira para me comunicar a distinção. Quando atendi a chamada, reconhecendo o número do João no visor do meu telemóvel, e depois de o saudar no ímpeto da nossa amizade secular, longe estava eu de que o motivo daquela chamada era, afinal, outro. Disse-me o João: tenho aqui ao pé de mim uma pessoa que te quer transmitir uma boa nova. Foi então que passou o telefone ao P. José. Nunca tínhamos falado pessoalmente. E a primeira conversa que teve comigo foi para me dizer que o Secretariado Nacional da Pastoral da Cultura, em conjunto com outras distintas personalidades, me tinham considerado digno de receber o prémio "Árvore da Vida - Padre Manuel Antunes". Apanhou-me desprevenido. Primeiro, corei de espanto. Depois, a emoção sincera.

Que importância atribui a esta distinção?
É uma distinção que prezo especialmente, pois consagra, de qualquer forma, a dimensão do insondável que eu sempre desejei, certamente, e seguramente, tentei, inocular naquilo que penso, que invento, que faço e que escrevo. O simples facto de sentir que aqueles que atravessam o século comigo têm recebido e descodificado esta mensagem, tantas vezes plasmada na minha obra de forma subliminar, é, só por si, uma manifestação de ressonância e de cumplicidade. É um doce ciclo de experiência humana que se consuma. Mas também tem o peso das coisas terríveis, no que esta palavra conserva etimologicamente: é grande e pesada a minha missão, responsabilizada agora e mais do que nunca pela volumetria dos mestres que receberam o prémio em anteriores edições: Adriano Moreira, Manoel de Oliveira, Maria Helena da Rocha Pereira, P. Luís Archer, Fernando Echevarria. Todos eles emitem o som cavo e inaudível que só as personalidades que navegam as águas profundas da subtileza parecem emitir. Sim: esse som cavo e appena sentito, que sempre adivinhei como um som semelhante ao do plasma eléctrico da espada do Darth Vader.
Bem sei que tenho barba branca e o cabelo, pouco que é, vai para mais que nevado. Mas tenho apenas 49 anos. Penso em Manoel de Oliveira. E coro de novo, perguntando-me que faço nesta galeria, e se não terá havido, por parte de quem me achou digno de receber o prémio, alguma precipitação.
Uma palavra para o P. Manuel Antunes, insigne pensador e pedagogo com tamanho legado, meu patrono espontâneo, a par de P. Luís Archer, ambos grandes jesuítas. Faço com eles uma viagem elíptica na minha vida, regressando ao Minho, ao Instituto Nun’Alvres, Caldinhas para os amigos, onde aprendi muito e bem. Respiro bem por aqui, por entre estes altos pinheiros do norte. Estou em óptima companhia, que é a Companhia de Jesus.

Que obras da sua autoria mais reflectem e manifestam o património cristão a nível cultural, artístico, bíblico e devocional?
Para não ser exaustivo, referiria três obras importantes na minha carreira. Aquele que considero ser o meu opus 1:Ciclo de Natal, de 1991. Este é um tema, aliás, que recorre na minha escrita, seja através de composições originais, como no caso referido, onde faço o tratamento dos célebres textos natalícios em latim, à guisa de motete, na depurada forma a-cappellaO magnum mysterium, Puer natus estVerbum carum factus est e Quem vidistis pastores?. Já vinha compondo desde 1987. Já escrevera, até, música mais façanhuda. Mas aqui, olhando para o presépio, ter-me-ei encontrado como compositor, no registo enxuto da sinceridade. O mestre, a inspiração, é o Mozart do Ave verum, onde o enigma que separa a simplicidade do meio da transcendência do fim é tamanha, que a coisa mais parece ser do foro de um saber alquímico. Mozart opera ali magia. Comove-nos, sejamos crentes ou ateus. Lembro-me com emoção, a este propósito, do êxtase de Fernando Lopes-Graça a escutar o meu Coral de Letras da Universidade do Porto num concerto realizado na igreja do Foco, na Cidade Invicta. Fazíamos, nesse concerto, reportório essencialmente seu. Mas quando começámos a cantar aquele licor mozartiano, Lopes-Graça elevou a cabeça para o alto e, enquanto as suas sobrancelhas oblíquas pareciam desenhar uma ogiva, os óculos embaciavam-se-lhe de emoção.
Em 1994 compus a minha primeira obra maior, com meios sinfónicos: In paradisum, para coro, quarteto vocal masculino e cordas, dedicada à doce memória de minha tia, Irmã Maria de Lourdes, que falecera em total ataraxia na Consoada de 1993. Data providencial, com algo de cíclico: morreu para renascer. A obra, para minha grande alegria, foi na altura, e tem vindo a ser desde então, interpretada em conjunto e na sequência do impalpávelRequiem de Fauré. Um pouco na linha desta obra, e citando o mestre francês, esta peça est d'un caractère doux comme moi-même. Fauré, outra das minhas grandes referências, tem uma visão mais introspectiva do que teatral. A minha leitura é também assim: íntima e serena.
Como já referi noutra ocasião, quando era criança, na fase de aprender as cores, minha mãe confrontou-me com a cor-de-rosa, cuja designação desconhecia. Depois de hesitar um pouco, disparei: isso é vermelho devagar. Seguindo este mote, este In paradisum é azul devagar. Tal como In paradisum, o Requiem à memória de Passos Manuel, composto dez anos depois, em 2004, que é uma extensão natural daquela obra, tendo com ela grandes afinidades, tem um tempo harmónico tendencialmente lento, que paira e produz uma sensação de textura lisa e fluente. Com excepção do Sanctus, que tem a energia dinâmica de um foguetão, com as tompas de capelo alçado, em registo éclatant, prevalece a sonoridade vaporosa da orquestração, criando um ambiente asséptico, andrógino e levemente enigmático. No último andamento, oIn paradisum propriamente dito, a música faz lembrar a inquietante imagem de São João Baptista no quadro A Virgem dos Rochedos, de Leonardo, assim indefinida, cheia de mistério, encoberta como está no sfumato dos harmónicos das cordas e no chiaroscuro das trompas mais a harpa. Esta atmosfera vaporosa como que paira na estratosfera. Cheira a ozono.
Poder-se-ia dizer que a música parte de ideias simples, de processos técnicos claros. A gramática é transparente. A concepção não pretende ser alta como o Everest. Nem sequer como a Serra da Estrela. Chega-lhe bem ter a altitude da minha amada Serra de Bornes: mais pequena, mas minha. Mais do que no tempo-curto das paixões humanas, tentei lançar estas minhas obras no tempo-longo, naquele tempo que emana do abismo dantesco sobre o Douro no Penedo Durão, perto de Freixo de Espada à Cinta, ou que ressalta dos magalitos do Cromeleque dos Almendres, ali ao pé de Évora, que estão no mesmo sítio há quatro milénios e lá permanecerão outros tantos, após todos nós – eu, que escrevo, e vós, que ledes - sermos varridos da face da terra, na voragem da morte.

Qual a composição da sua autoria que lhe é mais querida? Porquê?
Antes de individualizar uma obra, gostaria de referir que tenho três campos de acção composicional principais: a música para ou com crianças (a ópera A Floresta, sobre a história de Sophia de Mello Breyner Andresen, a cantata cénica O lobo Diogo e o mosquito Valentim, sobre a fábula de António Pires Cabral, O meu poemário infantil sobre texto de Violeta Figueiredo, e A arca do tesouro, sobre texto de Alice Vieira, minha última obra). Outro campo de acção importante é a harmonização da melodia popular portuguesa. Por questões matriciais de identidade, prezo especialmente este conjunto de peças que se constitui como uma espécie de projecto de vida. São já várias séries de harmonizações para coro a-cappella, que designo com o título genérico O que me diz o vento de… (até agora de Miranda, de Serpa, de Arganil, de Óbidos, daCalma que vai caindo, dos Trópicos e de Timor). É um projecto a que regresso sempre que estou desassossegado. Faz-me bem, aguçando-me o estilo, calibrando-me o lápis, oxigenando-me a alma. Vivemos numa época de agressiva globalização cultural segundo o execrável modelo pop anglo-saxónico. Portugal tem uma imensa e antiquíssima tradição poética, desde tempos trovadorescos, numa altura em que outras línguas se libertavam paulatinamente da guturalidade. Hoje a nossa identidade está em risco. Vivemos uma época de massificação. Ainda recentemente assistimos a um facto que comprova à saciedade esta subserviência cultural massificada e grotesca, com a RTP, o canal público televisivo, pago pelo dinheiro de todos nós, a dar um tempo de antena obsceno a uma cerimónia matrimonial anglicana que não nos diz minimamente respeito. A BBC e a casa real agradecem o pagamento dos direitos chorudos da transmissão televisiva, com certeza. E ainda levamos com esta merde* na abertura de todos os telejornais (*passando a gosseria, apenas estou citando Napoleão Bonaparte, que dizia que os ingleses, comerciantes indómitos, eram um povo com um jeito nato para o negócio, até da merde fazendo fortunas). Não há critério, tão pouco juízo crítico. Triunfou a pré-filosofia. A harmonização é um antídoto identitário. Nestas harmonizações de música popular de várias origens e de vários mundos, da Estrela ao Ramelau, do Douro ao Zambeze, cada som é essencial e também testemunha dessa portugalidade filtrada pela minha própria linfa transmontana. Eis, na minha existência, dos poucos valores matriciais que não discuto.
Por fim (os últimos são os primeiros), sublinho o campo sacro, seja através do tratamento de textos canónicos (muitas vezes a par com textos profanos, tais como textos populares, oriundos da antiquíssima tradição devocional portuguesa, por exemplo), seja através de uma inspiração: um quadro, uma escultura. Stigmata, para violeta e arcos, é uma obra concebida literalmente après une lecture de El Greco: inspirada no seu maravilhoso quadro O êxtase de S. Francisco (1580).
Respondendo directamente à sua pergunta, de entre todas as minhas obras, escolho como obra dilecta o Tríptico Mariano, a minha grande obra sacra, escrito em momentos diversos da minha vida. O primeiro quadro,Horto sereníssimo, composto em 2000, trata a Anunciação, inspirado nas serenas representações quatrocentistas de Fra’Angelico.
O segundo quadro deste tríptico, Magnificat em talha dourada, escrito anteriormente (em 1998), trata de Exultação da Virgem, inspirado na Madonna do pescoço comprido, obra-prima quinhentista de Parmigianino, um colo de inquietante desproporção que só Lhe eleva a santidade.
O terceiro quadro, Stabat Mater, composto em 2008, tratando da Dor da Mãe, é fortemente inspirado em duas obras: La Pietà Rondanini, a escultura pungente de Michelangelo Buonarroti (ca. 1564), e o dramático escorço de Andrea Mantegna, Cristo morto (ca. 1500).
Relativamente ao primeiro dos três quadros, o Horto sereníssimo, foi estreado na igreja de Nossa Senhora do Pópulo, nas Caldas da Rainha. Conheci o espaço num dia quentíssimo de Junho de 2000. Tive por aquela igreja uma espécie de paixão à primeira vista. Sendo sóbria, pequena e de uma ornamentação contida, ela tinha contudo aquela inefável harmonia de proporções que dão às formas um carácter universal no espaço e eterno no tempo. Visitei-a ao meio dia, no pino do calor. Havia no ar o odor iniciático das águas sulfurosas. Logo que entrei na igreja, a temperatura desceu subitamente, tornando-se balsâmica naquela frescura. Havia um ambiente de silêncio absoluto, aquele ambiente seráfico das Anunciações de Fra’Angelico, suscitando-me instintivamente o título da peça: Horto sereníssimo. A música seria de uma calma imperturbável como calmo era aquele sítio. Veio depois a grande provação da escrita da obra. Mais do que nunca, precisei eu que um anjo me fizesse uma visita e que me guiasse numa serena harmonia.
Quanto ao Magnificat em talha dourada, a obra foi concebida e escrita na minha aldeia em Trás-os-Montes, durante o mês de Julho de 1998, na companhia da canícula e da maré vaza do tempo. Foi estreada no espaço inefável da Igreja de São Roque, em Lisboa, no dia 24 de Outubro de 1998, por ocasião da celebração dos 500 anos da Santa Casa da Misericórdia. O Magnificat é uma obra tonal em Sol Maior, que é a tonalidade que sinto nas talhas douradas e nos espaços reverberantes de Deus. É uma homenagem ao Barroco, o estilo onde triunfa o movimento, as espirais inebriantes, o puro concerto dos sentidos. Como é natural, o espírito de Bach ecoa, pairando sobre a obra tal como, no princípio, o espírito pairava sobre as águas. Foi acrescentado ao texto canónico em latim, um conjunto de trechos em português que lhe é estranho, uma prática detropização e de contrafacta que foram muito comuns em tempos medievais. Esses trechos ou tropos profanos, acrescentados ao texto sacro, têm uma temática afim, provindos do culto mariano popular sob a forma de cantos de romaria e de cantos populares natalícios. Devido a este cruzamento de referências e a esta miscigenação de gestos, a obra está cheia de folia estilística, qual tapeçaria de Arraiolos de múltiplas cores e padrões. Para dar um pouco de unidade a tudo isto, o Magnificat em talha dourada sustenta a sua arquitectura em três grandes pilares firmados no princípio, no meio e no fim da obra, onde se pode escutar a citação da inefável melodia popular alentejana de Natal, Ó meu Menino, que confere à música não apenas um grande arco discursivo, assim como uma calma de todo o Alentejo deste mundo. Este aspecto trinitário, altamente simbólico e onde se cruzam o sacro e o profano, colheu-me desde o princípio.
Sobre o Stabat Mater, devo referir que, a propósito do tratamento que fiz do texto, e tomando como exemplos comparativos o tratamento que Luigi Nono faz do texto na sua obra Il canto sospeso (1956), com tendência a fragmentá-lo num gesto pontilhista, ou, para não ir tão longe, o tratamento que Emmanuel Nunes faz do poemaVislumbre (1986), de Mário de Sá Carneiro, decompondo-o serialmente nas suas várias dimensões, da gramatical à fonética, devo dizer que, tendo destas abordagens suficiente curiosidade e até bastante interesse, na qualidade de professor de análise, não me interessam minimamente, contudo, na qualidade de compositor. As várias obras de minha autoria que tratam textos, principalmente as que contêm textos sagrados, ancoram-se em dois grandes esteios: primado do texto e primado da melodia. Por isso, o meu tratamento do texto Stabat Materé fundamentalmente silábico e homofónico, para que não se perca uma única gota que seja da sua essência, e para que a sua mensagem não sofra qualquer distúrbio no seu percurso entre o intérprete e o ouvinte.
Referiria, para terminar, um momento no Stabat Mater com um significado especial: o tratamento do soneto de Camões, Deus benino. Mais uma vez um tropo, qual corpo extrínseco à sequência Stabat Mater. É um poema natalício de uma beleza solar, que faz faísca no eixo nevrálgico da obra. Ei-lo:
– Dece do Ceo imenso Deus benino
Para encarnar na Virgem soberana.
– Por que dece Divino em cousa humana?
– Para subir o humano a ser divino.
– Poos como vem tão pobre e tão minino,
Rendendo-se ao poder de mão tirana?
– Porque vem receber morte inumana,
Para pagar de Adão o desatino.
– Pois como? Adão e Eva o fruto comem,
Que por seu próprio Deus lhe foi vedado?
– Si, porque o próprio ser de Deoses tomem.
– E por essa razão foi humanado?
– Si, porque foi com causa decretado:
Se o homem quis ser Deus, que Deus seja homem.
Descida do divino em coisa humana e a ascensão do humano a divino! Esta coisa imaterial que é a ascensão, depois da dor, é a transcendência das transcendências. Se acreditamos, ressoamos na primeira pessoa. Se não acreditamos, ressoamos na terceira pessoa. Mas ressoamos.

Entrevista concedida por escrito em 30.4.2011.
Eurico Carrapatoso escreve de acordo com a antiga ortografia.

Eurico Carrapatoso
in SNPC

Eurico Carrapatoso distinguido pela Pastoral da Cultura

foto de João Tuna

Igreja Católica distingue compositor Eurico Carrapatoso com prémio "Árvore da Vida"

A Igreja Católica distinguiu o compositor Eurico Carrapatoso com a sétima edição do prémio “Árvore da Vida – Padre Manuel Antunes”, atribuído pelo Secretariado Nacional da Pastoral da Cultura, em parceria com a Renascença.

A justificação do júri sublinha que a «pessoalíssima gramática sonora» do autor «mergulha profundamente na tradição musical portuguesa», tendo por diversas vezes «origem ou motivação religiosa».

O júri, presidido pelo bispo do Porto e presidente da Comissão Episcopal da Cultura, Bens Culturais e Comunicações Sociais, D. Manuel Clemente, assinala igualmente o «diálogo» que o compositor mantém com autores do «cânone literário» português.

As referências à «paisagem, tanto a geográfica como aquela mental» do território nacional, fazem da obra de Eurico Carrapatoso «uma preciosa e inspirada meditação sobre Portugal» e o «destino comum» dos portugueses, acrescenta o júri.

«É uma distinção que prezo especialmente, pois consagra, de qualquer forma, a dimensão do insondável que eu sempre desejei, certamente, e seguramente, tentei, inocular naquilo que penso, que invento, que faço e que escrevo», realça Eurico Carrapatoso em entrevista publicada no site do Secretariado Nacional da Pastoral da Cultura.

Entre as obras da sua autoria, o compositor elege como preferida o “Tríptico Mariano”, composto por “Horto sereníssimo” (2000), “Magnificat em talha dourada” (1998) e “Stabat Mater” (2008).
Além de D. Manuel Clemente, o júri teve a seguinte constituição: cónego João Aguiar, presidente do Conselho de Gerência da Rádio Renascença, patrocinadora do prémio; António Vaz Pinto, diretor da Revista “Brotéria”; Guilherme d’Oliveira Martins, presidente do Centro Nacional de Cultura; Maria Teresa Dias Furtado, professora da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa; José Tolentino Mendonça, diretor do Secretariado Nacional da Pastoral da Cultura.

Nas edições anteriores, o prémio “Árvore da Vida – Padre Manuel Antunes” distinguiu o poeta Fernando Echevarria, o cientista Luís Archer, o cineasta Manoel de Oliveira, a professora de Estudos Clássicos Maria Helena da Rocha Pereira, o político e intelectual Adriano Moreira e o trabalho de diálogo entre Evangelho e Cultura realizado pela diocese de Beja.

Entre as personalidades premiadas até esta edição, Eurico Carrapatoso é a mais nova, com 49 anos.

por Rui Martins in SNPC

O prémio será entregue na próxima sexta feira, em Fátima, por ocasião das Jornadas da Pastoral da Cultura


Justificação do Júri
O Júri do Prémio Árvore da Vida – Padre Manuel Antunes deliberou, por unanimidade, atribui-lo, nesta que é a sua sétima edição, ao compositor Eurico Carrapatoso.

Eurico Carrapatoso nasceu no distrito de Bragança, em 1962. Iniciou os seus estudos musicais na década de oitenta, tendo sido aluno de José Luís Borges Coelho, Fernando Lapa, Cândido Lima, Constança Capdeville e, finalmente, de Jorge Peixinho, com quem concluiu, em 1993, o Curso Superior de Composição no Conservatório Nacional de Lisboa. Tem, desde então, desenvolvido ampla atividade no ensino e construído uma extraordinária obra no âmbito da criação musical, com trabalhos que vão da música orquestral, à música de câmara e coral, e que têm suscitado um justo reconhecimento, dentro e fora do país.

A sua pessoalíssima gramática sonora mergulha profundamente na tradição musical portuguesa, que tem, não raras vezes, uma origem ou motivação religiosa. Mas não apenas a tradição musical é revisitada por esta obra singular: o diálogo que tem sabido manter com autores do nosso cânone literário (de Bernardo Soares a Sophia de Mello Breyner Andresen, de Manuel Teixeira Gomes a Matilde Rosa Araújo, Alice Vieira, A.M. Pires Cabral, entre outros) e, curiosamente, com a própria paisagem, tanto a geográfica como aquela mental, do nosso território, fazem dela uma preciosa e inspirada meditação sobre Portugal e o nosso destino comum. 
O Júri do Prémio Árvore da Vida - Padre Manuel Antunes teve a seguinte constituição: D. Manuel Clemente, Presidente da Comissão Episcopal da Cultura, Bens Culturais e Comunicações Sociais; Cónego João Aguiar, Presidente do Conselho de Gerência da Rádio Renascença, patrocinadora deste Prémio; António Vaz Pinto S.J., Diretor da Revista “Brotéria”; Guilherme d’Oliveira Martins, Presidente do Centro Nacional de Cultura; Maria Teresa Dias Furtado, Professora da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa; José Tolentino Mendonça, Diretor do Secretariado Nacional da Pastoral da Cultura.

Esta é a sétima atribuição do «Prémio de Cultura Árvore da Vida - Padre Manuel Antunes», instituído pelo Secretariado Nacional da Pastoral da Cultura em parceria com a Rádio Renascença, e que, nas edições anteriores, distinguiu já o poeta Fernando Echevarria, o cientista Luís Archer s.j., o cineasta Manoel de Oliveira, a professora de Estudos Clássicos Maria Helena da Rocha Pereira, o político e intelectual Adriano Moreira e o trabalho de diálogo entre Evangelho e Cultura levado a cabo pela Diocese de Beja.

in SNPC

sábado, 11 de junho de 2011

Religiosidade na Música

Música e religião


É catolicamente tradicional a crença na música como forma de expressão mais capaz de traduzir a atividade do sentimento religioso. Para alguns místicos - por exemplo para a religiosa francesa do século XVII Margarida Romanet - o sentido por excelência da via unitiva seria pois o ouvido. Diz ela: «Pode ser-se fiel sem olhos, sem olfato, sem paladar e sem tato... Basta ouvir; o ouvido é o único sentido indispensável à .Esposa para agradar ao seu Esposo...» (...)



Mais humanamente claro, pois escrevia um tratado de música, foi o nosso teórico também seiscentista - o Padre Manuel Nunes da Silva - quando na sua Arte Mínima (1685) sustenta que a música compreende todas as ciências e que bastava Deus tê-la infundido ao primeiro homem para de todas as ciências o fazer conhecedor. A tese de moral geral do nosso compatriota é fácil de resumir: Sendo a música uma ordem, melhor a boa ordem, ela destrói toda a desordem...
(...)

A própria dança se rege pelos números: «...se procuras a causa motriz dos membros do próprio artista verás que está no número, visto que se movem calculadamente. E se lhe tiras das mãos a obra e do espírito a intenção de o fazer por forma a que a atividade dos seus membros não tenha outro fim senão o prazer ou a distração, tal atividade toma então o nome de dança. Se então queres saber o que agrada na dança responder-te-á o número: Eis-me» (Santo Agostinho).
(...)

Muitos degraus tem a escada da via unitiva. Não é a música por si só que produz, cria ou desenvolve o sentido religioso. Não é o «número» dos filósofos antigos ou dos cientistas modernos a sua causa. O matemático de Leibniz (“dum Deus calculai fit mundus”) -do mesmo Leibniz que considerava a arquitetura «música, cristalizada» - é outra reduçãode uma realidade que nos transcende.

Por essa razão, como o notou Henri Davenson numa extraordinária obra concebida na lição de Santo Agostinho, «porque não exigiríamos um Deus músico»?. Não longe desta ideia andava o nosso compatriota acima citado, pelo seu amor à arte dos sons...

No admirável livro de Davenson o princípio da moral cristã da música, quanto à sua prática, está em não esquecer que a música se situa na ordem dos valores humanos - eu diria, generalizando, na ordem dos valores naturais.

Trata-se sempre de colocar os valores na sua devida ordem da escala permanentemente ascendente se a queremos usada utilmente. É o que diz S. João Clímaco no seu tratado “Scala Paradisi”resumido por Davenson: «Para as almas puras que amam verdadeiramente a Deus, toda a música, tanto a profana como a sagrada, condu-las naturalmente para a alegria interior, para o amor divino e para as santas lágrimas; quanto aos que amam a voluptuosidade carnal, será precisamente o contrário. Tudo é puro para os puros; o mesmo é válido para a música e para toda a espécie de beleza: o próprio da alma que se tornou perfeita é, logo ao ascender para o Criador, tirar dessa perfeição proveito para cantar a glória de Deus... Se alguém se tornou capaz de tal e constante inclinação de espírito, podem dizer que desde logo está ressuscitado incorruptível sem esperar a Ressurreição Geral.»

O difícil é distinguir a «religiosidade» pura, da paixão ou até do sensualismo. O terreno é delicado e talvez não possível de distinções extremes, visto sobre a terra não podermos adquirir os corpos gloriosos que nos são destinados na bem-aventurança eterna. Não antecipemos pois...

É, por exemplo, pela própria etimologia dos termos quando despida de sentidos analógicos, inteiramente o contrário de cristãmente -místico este pensamento de Nietzsche que define a música como única arte «capaz de dar ideia do que se deve entender por justificação do mundo enquanto fenómeno estético.» Análogas observações, apesar da aparência, se podiam fazer a propósito de Schopenhauer que pretende ser a música a única arte que fala do ser, ao passo que as outras apenas dele exprimem a sombra... Para ele o mundo tanto poderia ser «música materializada» como «vontade materializada».
Estamos bem longe das conceções antigas...

Por certo alguns antigos Padres recearam a música, mas apenas a música sensual. (...)

A escrupulosidade exagerada não é obviamente um atributo da perfeição mas com certeza impede a demasiada «elasticidade» de costumes. Periodicamente a Igreja nos vem lembrar que o seu canto litúrgico tradicional é o chamado canto gregoriano.

É lendário o caso da música polifónica religiosa, prestes a ser banida da Igreja por exageros de simplicidade, modéstia ou ascetismo, ter sido salva por Giovanni Pierluigi da Palestrina (1524-1594) com a sua missa dedicada ao efémero Papa Marcello; mas as lendas fazem-se à custa da História, quantas vezes iluminando-a e tirando dela a lição lapidar que convém fixar.

Assim sempre foi necessário acrisolar, purificar a tradição, compilá-la e fixá-la, ainda que sempre provisoriamente, por isso que a tradição é coisa vivente e portanto mutável.

Foi o que fez Santo Ambrósio em Milão (339-397) - daí o «canto anbrosiano» - e mais tarde S. Gregório Magno (papa de 590 a 604) - donde o «canto gregoriano» - cuja apologia da música religiosa - a que nos liga a Deus - Se pode ler em “Enerratio in Psalmos Davidicos”.

Toda a história bíblica está cheia de cânticos e danças. O canto dos Salmos tudo supera pois «o salmo é o louvor de Deus vez da Igreja, musical profissão de fé. O Apóstolo proibiu as mulheres de falar na Igreja, mas não de cantar... Que é pois o salmo senão o órgão das virtudes que pulsado pelo venerável profeta com o plectro do Espírito Santo espargiu na terra a doçura dos seus celestiais sons?»

Mais rigorista é S. Cirilo de Alexandria que proscreve da Igreja a música instrumental. O salmista menciona liras, cistros e Outros instrumentos, porque tais instrumentos, como os sacrifícios cruentos, se admitiam na Antiga Lei mas, aos que foram reformados peio Espírito, se lhes manda cantar um cântico novo «Cantare domino canticum novum...»

S. Bernardo de Claraval (1090-1153) definiu cabalmente o que se pede ao canto religioso: «O canto deve ser cheio de gravidade; não será nem mundanal, nem demasiado rude e pobre. Deve ser suave, mas não efeminado e, ao mesmo tempo que agrada ao ouvido, deve mover os corações. Há de aliviar a tristeza, moderar a ira. Não contrariará o sentido das palavras, mas relevá-lo-á, pois não há pequena perda de graça espiritual em sermos distraídos do proveito do sentido pela beleza de canto, e em sermos levados a atentar na mera exibição vocal quando deveríamos pensar no que se canta.»

Mas o nosso propósito não é fazer a história da música religiosa nem sequer o da música litúrgica. O mais despretensiosamente que nos fosse possível quereríamos dar uma ideia de que seja a verdadeira religiosidade na música; a sua serventia e a sua grandeza, enquanto meio -entre material e espiritual, atuante na via unitiva, o caminho místico que nos deve conduzir a Deus.

Repito com S. João Clímaco: «para os puros tudo é puro»; e comento ou acrescento que, para eles, o próprio mal é meio de exercer a virtude e que a graça tem ínvios caminhos que nos não é dado prescrutar. Que o menos puro possa purificar também ou ser um degrau da tal escada do Paraíso que dá o título à obra de que citámos o passo imediatamente atrás, é o que nos não repugna a aceitar. Será o «pão partido em pequeninos» um rápido fugidio raio de luz, mas não bastará por mercê de Deus para salvar alguém? Mesmo essa música menos pura pode bem ser o rumo que a Deus nos leve... (...)

Para rapidamente me desempenhar de parte da primeira, das minhas intenções vou arrimar-me à autoridade de Henri Davenson no livro de que já me socorri e que leva a sua excelência e bondade ao ponto de fornecer um resumo «sob forma de esquema geométrico» de tido o seu riquíssimo conteúdo.

«Como servirmo-nos da música?» Já o dissemos: Para o saber fazer «é preciso situar a música na ordem dos valores humanos». Dois erros fundamentais se nos apresentam no decorrer da história. O primeiro é o erro a que Davenson chama «romântico e gnóstico»: a música, é tomada como revelação do Absoluto, é equivalente da experiência mística. Tal erro repugna à consciência cristã, e baseia-se na ilusória confusão entre o silêncio do espírito e o «éon Silêncio, o Abismo da mitologia gnóstica.»

Outro erro é o do formalismo (como já o fora do Islamismo): toma-se a música como jogo vão, mera frivolidade, eco da beleza do mundo perecível. Quer a nossa experiência quer a realidade musical se encarregam de o refutar. Corresponde à definição setecentista da música como arte de combinar os sons por forma a agradarem ao ouvido...

Em contrapartida o augustianismo franciscano, explicitado pelos monges de Santa Catarina do Sinai, S. João Clímaco e S. Francisco de Assis, acolhe a música não se limitando a tolerá-la mas concebendo-a como meio de oração e caminho para, de dentro de nós próprios, caminharmos para Deus.

Como técnica auxiliar da vida espiritual a música, segundo Davenson, apropria-se do homem, fixa a sua atenção, liberta a consciência do seu conteúdo sensível, o que constitui o seu papel de aspeto dionisíaco - função aliás provisória e inferior. Aprofundando-se conduz a alma ao silêncio do espírito, se formos capazes de levar a experiência até às suas últimas consequências. Assim conduz a um recolhimento e a uma paz que dão à alma espiritual a possibilidade de receber uma primeira imagem da Beleza infinita. Esta aplicação da música «variará em fecundidade conforme a vocação de cada um; sob a sua forma mais elevada será uma imitação do estado angélico.»

Em quatro «exercícios de aplicação» Henri Davenson dá-nos excelentes exemplos de aplicação da teoria.
O primeiro refere-se ao «paradoxo da música ligeira»; lícita e útil para os lazeres do auditor, mas «séria» mesmo quando «ligeira», porque sempre será «imaterial» e «espiritual». Não é «triste» nem «alegre» por sua natureza: situar-se para além do alegre ou do triste.

Outro caso «resolvido» é o da «antinomia da música pura». A questão tem feito e fará correr rios de tinta. Para Davenson, o conceito é útil ao filósofo, mas a música pura por essência não deve servir para esquecer a finalidade humana da arte: Há que criar «música humana, plenamente humana que nem por sê-lo deixe de ser menos música». A conclusão agradará no que lhes é permitido... - aos mais esturrados materialistas...

A ética do compositor expõe-se no terceiro «exercício». O artista não é, como mais ou menos pretendiam os românticos, nem um deus criador nem um profeta. Artesão e operário, mas homem e não ave canora. Nunca se deverá esquecer que é sua obrigação salvaguardar a sua dignidade humana e a finalidade da sua arte.

Finalmente, como «prolegómenos a um tratado da Forma», Davenson afirma que «forma musical não deve confundir-se com o sistema de fórmulas e esquemas sonoros que não passam de meio secundário - elemento contingente e convencional da músicas.» A forma é «mais para além disso, inseparável do sentido que a obra reveste para a alma e reside na unidade interior e orgânica dessa obra». Para alguns contemporâneos qualquer obra «moderna» não pode ter sentido religioso mesmo quando a intenção do autor tivesse sido insuflá-lo na obra.
(...)

Na linha da doutrina que propusemos insere-se evidentemente - descontando o exclusivismo  «profissional» — o que escreveu  Beethoven a Bettina von Brentano (...): «A música é a única introdutora no mundo superior a este mundo que abraça o homem mas o homem não consegue abraçar». Com certeza tresvaria quando considera a música, em si,como «uma revelação mais alta que toda a sabedoria e toda a filosofia». Poderíamos tentar uma apologia ortodoxa do pensamento de Beethoven, mas cremos que seria forçado exercício sofístico. No entanto quero deixar honestamente a questão em aberto, citando outra vez o grande artista da “Missa Solene”que também não esqueceu “Cristo no Jardim das Oliveiras”:«Tudo o que Deus criou era puro e sem mácula. Se, mais tarde, cego pela paixão, naufraguei no mal, depois de longa expiação e de me ter purificado, voltei à fonte original pura, nobre, à Divindade e à minha arte.»


Se não podemos fazer de Beethoven um modelo de católico, no entanto, se isto não é religiosidade, então não sei o que o seja! Podemos quanto o quisermos - mas certamente  sem nenhuma caridade cristã - duvidar de certas expressões, mesmo musicais, do misticismo de Liszt mas creio que não nos é lícito duvidar da sinceridade do autor da “Missa de Grau” e de “Santa Isabel Rainha da Hungria”, quando em janeiro de 1864 escrevia a um desconhecido correspondente (talvez Jules Janin, seu amigo íntimo) o seguinte: «Segui o vosso bom exemplo aproveitando também de um piedoso retiro. Durante a novena da Circuncisão, no primeiro domingo da Epifania, dois reverendos Padres Dominicanos de grande mérito fizeram uma missão na igreja paroquial da “Madona dei Rosário”contígua ao meu domicílio como sabe. Assisti regularmente às suas pregações quotidianas, e no último domingo foi-me concedida a inefável felicidade da Comunhão. - Depois de tal começo de ano, desejo apenas que no resto dos meus dias no exílio terrestre me aproxime cada vez mais da nossa verdadeira pátria. (...)

Neste ponto da nossa exposição apenas queríamos deixar um lampejo das provas que poderiam aduzir-se para termos a certeza de que o sentimento religioso nunca andou muito alheio ao espírito da grande maioria dos máximos valores da música.

Não há que confundir, primariamente, os efeitos físicos da música com os seus efeitos espirituais, e menos com os seus efeitos finais no que deles nos interessa agora e aqui. É claro que não se deixará de ter em vista a conexão íntima entre corpo e alma. Os efeitos físicos da música são evidentes a qualquer observador de mínima atenção. Menos estudada a sua aplicação sistemática em medicina - o que não quer dizer que o assunto não tenha já uma vasta bibliografia.

Do Velho Testamento é típico o caso de David acalmando Saul, ao som da sua cítara e da sua voz. Conhecidíssimo o efeito do canto de Farinelli sobre a quase loucura de Filipe V de Espanha. A mesma melancolia depressiva - passe o termo vago que deixo aos neurologistas o trabalho de precisar - herdou-a o filho, Fernando VI, e foi ainda Farinelli que o tratou com o seu canto. Milhões de contemporâneos, conscientemente ou não, diariamente usam e abusam da música, alternadamente como calmante e como excitante. É bem provável que seja o menos contraindicado dos «tranquilizadores» e o mais benéfico dos excitantes.

O que nos interessa apenas é frisar que a música religiosa deve começar por conseguir o mais perfeito dos estados físicos propício à comunicação com Deus, em seu louvor, ou em oração impetrativa. Por isso também não confundamos o real sentido da música com a forma de expressão resultante do temperamento e da originalidade do autor ou, menos ainda, com formalismos que podem ser epocais, regionais ou modismos.
(...) 

A catolicidade da liturgia recomenda-nos vivamente o canto gregoriano. Não podemos entrar em questões técnico-históricas sobre as suas origens, mas esses processos têm evidentemente que se procurar no Médio-Oriente, e isto se nos quisermos ater apenas ao período subsequente ao da Incarnação do Salvador.


É questão musicológica delicada saber se o canto litúrgico primitivo, mas já caracterizadamente cristão, era ou não acompanhado com instrumentos de percussão. Dom Jeannin era da opinião que sim. O bispo Theodoreio informa-nos que em Mileto, na Ásia Menor, «o canto dos hinos era acompanhado de palmas, movimentos rítmicos e toques de campainhas...; as intenções mais tardias... provam pelo menos a longa tolerância de tais usos. A polémica em volta do ritmo do canto gregoriano apenas fez com que se obscurecesse o sentido dos termos ligados a esta questão».
.
Seria, se o pudéssemos, ocasião agora de dizer duas palavras sobre danças religiosas cristãs. Se nunca no catolicismo houve propriamente danças litúrgicas, sempre houve, e recentemente se procurou renovar, uma tradição perfeitamente lícita de dança religiosa.
(...)


A polifonia de um Machaut (m. 1377) não tem a doçura de contornos da de um Vittoria (1540-1613) o ibérico - além de que estes como informa o teórico Gaffurio (1541-1522) choram a cantar e são amigos do bemol. Compare-se um trecho da “Messe de Notre Dame” de Dufay, com o responsório “Tenebrae facta sunt” de Vittoria. Mas também não nos esqueçamos da diferença de séculos que separa as duas obras-primas. Continuamos a fazer análise - passe o exagero do termo - meramente estética. É natural que a sensibilidade tivesse evoluído, embora a finalidade fosse sempre a mesma.

Não se pede ao compositor de música religiosa ou até ao da música litúrgica - isto é destinada expressamente a atos litúrgicos fundamentais ou tradicionais - que perca a sua personalidade e individualidade ou originalidade de artista; o que é essencial é que elas se não exprimam “solipsisticamente” e procurem de facto a união da comunidade dos fiéis com a Divindade. Devem ter, afinal, as três virtudes teologais: Fé, Esperança e Caridade... A caridade de dar aos outros para estes entregarem a Deus o que d'Ele afinal veio.

O que nunca será critério são de reconhecimento de religiosidade na música é o de esta ser imediatamente agradável ou não ao ouvido. Nunca é demais demonstrar a inanidade da definição hedonística de música, como arte de organizar os sons por forma que satisfaçam o ouvido. Por analogia teríamos como artes irmãs da música (feita para agradar ao ouvido), a culinária (arte de agradar ao paladar), a perfumística (arte de agradar ao olfato) e outra “arte” “inominata”... de agradar ao tato! Não vou discutir o que essas técnicas possam ter de arte nem sequer atormentar os ouvintes com música que eu julgue religiosa, mas não considero mais ou menos imediatamente aceitável ao gosto médio dos que me leem.

Prefiro chegar ao século XVIII e considerar a religiosidade profunda de um trecho do “StabatMater» de Pergolesi, Um passo atrás no tempo e lembremos um trecho da música de Frescobaldi (1538-1643) da “Messa della Madona”.

Outro em frente e escutemos um pouco de Beethoven na sua “Missa Solene” certamente não litúrgica, mas à qual só um extremismo rigorista negará religiosidade. Dos nossos dias oiçamos um pouco do místico teatro trágico da “Jeanne d'Arc au Bûcher” de Claudel e Honneger.

E religiosidade perfeitamente litúrgica se encontra no “Padre-nosso” e na “Ave Maria” que vos quero lembrar para terminar esta descosida exposição. Talvez não seja fácil adivinhar o século a que pertence quem compôs essas páginas de ática elegância, economia de meios e... religiosidade. É um contemporâneo. Ainda vivo. Dado algum dia por o maior revolucionário musical do nosso século... Sim. Devem-se a Igor Stravinsky. Numa dialética perfeita negou Stravinsky que fosse um revolucionário. Pelo contrário: odiaria todo o “revolucionarismo”. Confessa-o na sua estupenda “Poética Musical”, em que recolheu as lições professadas pelo mestre na sua cadeira de Poética, instituída por Charles Eliot Norton na Universidade de Harvard. E será Stravinsky... religioso? Quanto à economia de meios cita ele S. Dionísio Aeropagita ou, se o quiserem, o Pseudo-Dionísio, para quem a dignidade dos anjos é também maior na hierarquia celeste quanto menor é o número de palavras de que dispõe a sua linguagem. Quanto à obra em si, diz Stiravinsky que uma vez realizada se espalha para se comunicar, e reflui para o seu princípio. «O ciclo fecha-se então. E assim se nos apresenta a música como elemento de comunhão com o próximo - e com o ser».Ora o ser, em boa metafísica é, no caso sujeito, Deus.

Não vejo mal de maior que Beethoven, por exemplo, pensasse na humanidade ao escrever música religiosa. Não nos esqueçamos que o homem é ao mesmo tempo corpo e alma; não olvidemos que os exageros de pureza têm conduzido às piores aberrações - «qui veut faire l’ange fait la bête” disse lapidarmente Pascal.

E não nos esqueçamos, sobretudo, da caridade. O grande Apóstolo nos deixou a palavra de advertência: — «Como dizeis amar a Deus invisível se não amais o próximo como Sua imagem visível?»

Esta transcrição omite as notas de rodapé.

José Blanc de Portugal
In Brotéria (1960)

O texto na íntegra está publicado in SNPC

Porque estou aqui

Sinto-me privilegiado por ter encontrado na Igreja um lugar vazio, feito à minha medida. É certo que tê-lo encontrado (ou encontrá-lo renovadamente, pois não é dado adquirido) foi também mérito da minha sede, do meu empenho, de não baixar os braços e achar, passivamente, que não seria possível. Passo a contextualizar: a comunidade onde vou à missa é pequena e acolhedora, e podia bem não o ser. Ao mesmo tempo, sentia um desejo grande de reflexão de vida cristã e encontrei um casal (heterosexual) que tinha a mesma vontade. Começámo-nos a reunir semanalmente numa pequena comunidade de oração e reflexão que, apesar de crítica, nos tem ajudado a sermos Igreja e a nela nos revermos. Paralelamente, face ao contínuo desencanto em relação a algumas posturas e pontos de vista de uma Igreja mais institucional e hierárquica, tive a graça de encontrar um grupo de cristãos homossexuais, que se reuniam com um padre regularmente, sem terem de se esconder ou de ocultar parte de si.

Sei que muitos cristãos homossexuais nunca pensaram sequer na eventualidade de existirem grupos cristãos em que se pudessem apresentar inteiros, quanto mais pensarem poder tomar parte e pôr em comum fé, questões, procuras, afectos e vidas.

Por tudo isto me sinto grato a Deus e me sinto responsável para tentar chegar a quem não teve, até agora, uma experiência tão feliz como a minha.

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