Quando descobrimos nas
nossas vidas a importância do mistério de Deus, entrámos em expectativa. A
resposta que é dada a esta espera não consiste em satisfazê-la, mas em
aprofundá-la mais. Aí alcançamos o que há de mais espantoso na relação do homem
com o mistério de Deus: se este mistério se anuncia em nós, ele não suprime a
carência que nos permitiu estarmos atentos a esta revelação. Se o mistério de
Deus se revela a partir da expectativa, não é suprimindo a expectativa, é
tornando-a mais quotidiana, mais permanente, mais necessária. Por exemplo, o
amor não satisfaz a expectativa do amor, a aproximação da verdade não diminui a
paixão da verdade. Bastar-nos-ia então estar apaixonados pela verdade para que
a nossa vida fosse verdadeira, ser desejosos de amor para amar e ser amado,
estar na expectativa do mistério de Deus para que Deus seja presente em nós?
A atitude espiritual que
então seria a nossa consistiria em esperar a revelação de Deus mais do que
pretender possuir as certezas dela. De qualquer modo, àqueles que estão pouco
certos de estarem certos, é proposto serem, na noite, sentinelas que esperam a
aurora. Não nos é pedido que tenhamos fé como se possuíssemos o mistério de
Deus, mas que sejamos sentinelas que sabem que a noite é a noite e que esperam
que a aurora será a aurora. Na paciência que precede o dia, estamos atentos a
essa experiência espiritual do mistério de Deus em nós, e estamos dispensados
de pronunciar o seu nome.
Mas nós lembramo-nos do
seu nome, quando perdemos o rasto. Como é espantoso poder evocar a memória do
seu nome, precisamente quando somos os seres do começo, há pouco anunciados.
Talvez esteja aí o futuro da fé: Deus é sempre vindouro. Se não houvesse a
noite e o dia, as idades e as estações, a alegria e o cansaço, teríamos a «fé
dos anjos». A nossa fé é a do tempo do homem, da evidência da juventude à idade
madura em que se descobre que a impaciência do tempo se tornou paixão da
interioridade.
Sentinelas dessa
madrugada que nasce entre nós… Atentos a essas palavras que não podemos
pronunciar, que quereriam dizer tudo aquilo que somos e que se entregam num
olhar, num silêncio, numa emoção contida. Sentinela do nosso ser que desperta,
sentinela do outro, da sua felicidade, e sentinela junto da infelicidade do
outro.
Tudo nos vem por reflexo,
por eco, por transparência. Entre aquilo que ignoramos do infinito de Deus e
aquilo que descobrimos de nós mesmos, nós penetramos no universo maravilhoso
das correspondências. Captá-las quando elas passam é a contemplação de que
somos capazes.
Bernard Feillet – Les arbres dans la mer. Paris, DDB, 2002, p.70-72.
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