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A diversidade na Igreja

"A casa do meu Pai tem muitas moradas", diz-nos Jesus no evangelho.

A unidade na diversidade não é sempre aparente na Igreja enquanto povo de Deus, mas é uma realidade em Deus e uma presença na fé cristã desde a sua origem. A Palavra de Deus não é partidária, elitista e exclusiva. O Reino de Deus é como uma árvore que estende os ramos para dar abrigo a todos os pássaros do céu. Cristo não morreu na cruz para salvar uma mão cheia de cristãos. Até o Deus Uno encerra em si o mistério de uma Trindade.

A Palavra de Deus é inequívoca e só pode levar à desinstalação, à abertura ao outro, e a recebê-lo e amá-lo enquanto irmão ou irmã. Ninguém fica de fora, nem mesmo - se tivessemos - os inimigos.

Muitos cristãos crêem nesta Igreja, nesta casa do Pai, corpo de Cristo, templo do Espírito Santo. Mas como esquecer que muitos se sentem "de fora" por se verem rejeitados, amputados e anulados, e afastam-se por ninguém lhes ter mostrado que há um lugar para cada um, com a totalidade do seu ser?

Um blogue para cristãos homossexuais que não desistiram de ser Igreja

Porquê este blogue?

Este blogue é a partilha de uma vida de fé e é uma porta aberta para quem nela quiser entrar. É um convite para que não desistas: há homossexuais cristãos que não querem recusar nem a sua fé nem a sua sexualidade. É uma confirmação, por experiência vivida, que há um lugar para ti na Igreja. Aceita o desafio de o encontrares!

Este blogue também é teu, e de quem conheças que possa viver na carne sentimentos contraditórios de questões ligadas à fé e à orientação sexual. És benvindo se, mesmo não sendo o teu caso, conheces alguém que viva esta situação ou és um cristão que deseja uma Igreja mais acolhedora onde caiba a reflexão sobre esta e outras realidades.

Partilha, pergunta, propõe: este blogue existe para dar voz a quem normalmente está invisível ou mudo na Igreja, para quem se sente só, diferente e excluído. Este blogue não pretende mudar as mentalidades e as tradições com grande aparato, mas já não seria pouco se pudesse revelar um pouco do insondável Amor de Deus ou se ajudasse alguém a reconciliar-se consigo em Deus.
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terça-feira, 10 de abril de 2018

Thomas Merton

Do ermitério fez um púlpito sem fronteiras: solidão e comunhão, contemplação e ação

«No último dia de janeiro de 1915, sob o signo de Aquário, num ano de uma grande guerra, na fronteira com a Espanha, à sombra dos montes franceses, vim ao mundo. Feito à imagem de Deus, e por isso livre por natureza, fui todavia escravo da violência e do egoísmo, à imagem do mundo em que nasci. Aquele mundo era o quadro do inferno, cheio de homens como eu, que amavam Deus e contudo o odiavam, e, nascidos para o amar, viviam no temor e no desespero de apetites contrários.» Assim escreveu Thomas Merton no início daquele que é, talvez, o seu trabalho mais conhecido, “A montanha dos sete patamares”, de 1948, evocando o dia do seu nascimento, em Prades, de Owen, neozelandês, e de Ruth Jenkins, norte-americana, pintores “globe-trotter”.

Um aniversário a assinalar por vários motivos que encheram uma vida de apenas 53 anos mas que foi intensa e original, como a sua espiritualidade. Escritor que evoca o visionário William Blake, Merton foi protagonista de um corajoso compromisso pela paz (fonte de diatribes com os superiores, depois valorizado por João XXIII e Paulo VI, com quem trocou correspondência), e também ponto de referência para o movimento não violento pelos direitos civis, preconizando uma paz fundada em argumentos evangélicos e confiada ao testemunho («uma parte essencial da Boa Nova é que as medidas não violentas são mais fortes do que as armas: com armas espirituais a Igreja primitiva conquistou todo o mundo romano»), que permanece hoje com toda a atualidade, como mostra o seu ensaio “Paz na era pós-cristã”.

Antes, ainda, Merton foi sobretudo um monge inquieto, mas que transformou o eremitério, com a pena, num púlpito sem fronteiras, e, com a oração, num tabernáculo onde guardava, juntamente com a Eucaristia, cada irmão; um trapista defensor da vida monástica eremítica e comunitária, convicto de «ter viva no mundo moderno a experiência contemplativa e manter aberta para o homem tecnológico dos nossos dias a possibilidade de recuperar a integridade da sua interioridade mais profunda». Até transformar a sua própria parábola numa narrativa incessante da procura de Deus, vivendo-a entre solidão e comunhão, contemplação e ação.

Além disso, Merton é recordado como homem do ecumenismo e do diálogo, respeitador das diferenças e concentrado no essencial. No diálogo inter-religioso, mais explorativo que funcional, foi pronto a abrir-se a hinduístas, budistas, judeus, islâmicos, a procurar as fontes vitais das outras religiões («se me afirmo como católico apenas negando tudo que é muçulmano, judeu, protestante, hindu, budista, no fim descobrirei que me não resta muita coisa com que me possa afirmar como católico. Certamente não terei o sopro do Espírito com o qual possa afirmá-lo»), e com uma forte atenção às expressões orientais: vejam-se as suas reflexões reunidas por William H. Shannon (“A experiência interior”), ou a recolha em que reinterpreta um dos pais do taoismo (“A via de Chuang-Tzu”).

Merton distingue-se também pelo diálogo com os não crentes, declinado na capacidade de ver sinais de «fé inconsciente» nos ateus, ou de «ateísmo inconsciente» nos crentes («o grande problema é a salvação daqueles que, sendo bons, pensam que já não têm necessidade de serem salvos e imaginam que a sua tarefa é tornar os outros bons como eles»). Uma vida contemplativa, a sua, nunca isolada da realidade. E uma vida consagrada concebida como porta aberta ao amor.

Ficando órfão ainda criança, com o irmão John Paul (perde a mãe em 1921 e o pai dez anos depois), Thomas passa parte da infância nos EUA, e da sua formação na França e na Inglaterra passa a Nova Iorque em 1934, completando os estudos na Universidade de Columbia. Chegado ao catolicismo em 1938, deixando para trás a busca de prazer («a minha conversão foi ajuda de Deus, como cada conversão, e da minha parte foi estudo e procura»), três anos depois, durante a Segunda Guerra Mundial, entra na abadia de Nossa Senhora do Getsémani, no estado do Kentucky, entre os Cistercienses de Estrita Observância. Em 1949 é ordenado padre.

Uma “meta” após um percurso marcado por estudos, viagens, desorientações, encontros, pelo contínuo interrogar-se sobre o sentido da vida, até à atração pelo claustro. Um percurso cujas etapas se refletem em muitas páginas, por vezes atormentadas, mas orientadas na direção da Graça, espalhadas entre “Nenhum homem é uma ilha” (1953), “O sinal de Jonas” (1952), “Sementes de destruição” (1966), sem esquecer “Sementes de contemplação” (1949), e outros escritos, onde a vida contemplativa nunca é fuga do mundo, mas entrada num diálogo profundo com o ser humano.

Enquanto se aguarda que um editor se disponibilize a publicar a versão integral dos seus diários, poder-se-á ler “Merton na intimidade: sua vida em seus diários”, organizado pelos irmãos Patrick Hart e Jonathan Montaldo, síntese que segue o percurso traçado pelo diário que Merton escreveu desde os 16 anos até à morte.

Desde o apartamento no n.º 35 de Perry Street, em Manhattan, e das câmaras de abrigo em Miami e Cuba, até ao “bungalow” de Banguecoque, onde um ventilador o fulminou, a 10 de dezembro de 1968 (encontrava-se lá para um congresso sobre monaquismo, e, como documenta o “Diário da Ásia”, estava bem preparado), passando pelos espaços a ele familiares na abadia do Getsémani (a enfermaria, a cripta dos livros raros, onde escrevia, o depósito escolhido como dormitório), a sequência irradia os pensamentos do monge «viandante de reinos» nascido há cem anos. Tão distante e tão próximo.

Marco Roncalli In "Avvenire"
Tradução e edição de Rui Jorge Martins, publicado em 28 de janeiro de 2015 in SNPC

terça-feira, 3 de abril de 2018

Discípul@s de Jesus

Somos chamad@s a ser fecund@s

Queridos irmãs e irmãos

Hoje, neste passo do Evangelho de S. João que proclamamos, aparece-nos uma interpretação da palavra “discípulo” que é importante nós tomarmos para a nossa reflexão. Porque nós damos por descontado que somos discípulos de Cristo, porque o nosso próprio batismo tornou-nos isso. Consideramos o discipulado como a categoria de base, a categoria que é ponto de partida.

Esse entendimento continua certo, há que dizê-lo. Antes de toda a nossa ação, todo o nosso mérito, de toda a nossa construção, nós somos em Cristo. Recebemos a Sua força, o Seu vigor, é Ele que nos ilumina, recebemos a Sua graça, a Sua presença nas nossas vidas. De maneira que nós somos à partida discípulos de Cristo. Mas há um outro entendimento que emerge das palavras do Senhor que hoje escutamos. Esse entendimento coloca o termo “discípulo” não como ponto de partida, mas como ponto de chegada de uma vida que tudo faz, que em tudo se empenha, que se compromete autenticamente para se tornar uma vida semelhante à de Jesus.

Nós não somos discípulos porque começamos um caminho. Nós somos discípulos porque ao longo do nosso caminho, um caminho necessariamente demorado, complexo, paciente, um caminho necessariamente feito de tantos, de múltiplos recomeços, a verdade é que, no final desse caminho, há alguma coisa em nós que sem palavras nos liga à pessoa de Jesus, à lição de Jesus, ao modelo de Jesus. Então é a forma de viver, é a modalidade da nossa própria existência, é a forma, a configuração que damos à vida que nos faz ou não ter este nome de discípulos de Cristo.

Só numa vida de permanência em Jesus e numa vida fecunda nós podemos dizer que somos discípulos de Cristo. Esta dupla aceção que a palavra “discípulo” tem no discurso do Senhor introduz, sem dúvida, uma tensão na nossa vida. Não podemos estar parados, não podemos estar de braços cruzados a achar que tudo está adquirido, e que basta o que temos, e que podemos estar satisfeitos com o que fazemos.

Nós somos chamados, na Páscoa de Jesus, a um sobressalto, a uma transformação. A vida não pode ficar a mesma. Nós somos chamados a dar fruto, somos chamados a uma fecundidade interior. Que só vem também quando nos dispomos, verdadeiramente, a multiplicar os talentos, a dar outros passos, a abrir as nossas mãos, a adensar a nossa experiência espiritual. Somos chamados a ser fecundos. Como diz o Senhor: “A glória do Meu Pai é que deis muitos frutos.”

Num domingo como este, o V domingo da Páscoa, em que a questão é o fruto, que fruto nós damos? Qual é a fecundidade das nossas vidas? A nossa fé serve para quê? Enche o nosso coração de que coisas? Num domingo como este, em que esta é a questão decisiva das leituras da palavra de Deus, é muito importante que cada um, no seu coração, possa de facto sentir que somos chamados a passar da escassez e da retenção à multiplicação da vida. Que não podemos estar a diminuir, a subtrair o significado da vida, mas todos nós somos chamados a multiplicar a vida que nos é dada. E multiplicar a vida é torna-la fecunda, é sentir que a nossa participação em Cristo atua em nós muito fruto. Fruto de vida.

É interessante que nas Cartas de S. João nós temos um critério muito prático, mas também muito seguro, do ponto de vista espiritual, para olharmos e fazermos um balanço, um exame de consciência da nossa vida. A Carta de S. João coloca, de facto, o centro deste balanço naquilo que diz o nosso coração. O que é que me diz, hoje, o meu coração em relação à minha vida? Ele pede-me mais? Ele pede-me outras coisas? O meu coração está em paz com a vida que eu vivo? Se o meu coração tem reivindicações, se o meu coração me põe perguntas, se o meu coração me pede mais eu tenho de ouvi-lo. Eu tenho de ouvi-lo. O critério numa vida espiritual é: há paz no teu coração? Há paz nessa consciência que é o santuário íntimo onde o homem e a mulher se encontram com Deus?

Eu estou em paz ou sinto que estou parado, ou sinto que faço pouco, sinto que fico aquém, sinto que não dou o fruto que podia dar? E se eu sinto essa insatisfação em mim, eu tenho o dever de escutá-lo, tenho o dever de escutá-lo. Porque é pelo meu coração que Deus fala. É pelo meu coração, antes de tudo, que Deus fala. Eu posso ouvir muitas coisas e isso ser importante, mas a grande mensagem de Deus é-me dita pelo meu coração. Se o nosso coração não tem paz, temos de tomar a sério, temos de colher as implicações, temos de fazer um discernimento. Sabendo que, mesmo quando o nosso coração é pequeno e pobre, Deus é sempre maior que o nosso coração. Deus pode tornar sempre maior o nosso coração.

Nesse sentido há aqui uma confiança fundamental que é preciso trabalhar ao mesmo tempo que trabalhamos o nosso sentido de justiça, de autenticidade, de verdade.

Porque, como diz a Carta de S. João, não podemos ficar a amar Jesus e a amar os irmãos, não podemos ficar apenas a ser discípulos de Jesus por palavras e pela língua, temos de o ser também pelas obras. E todos sabemos como isso é mais difícil. É muito mais fácil dizer que sim e depois logo se vê, se sim se não. Outra coisa é ter a vida hipotecada à palavra do Senhor. Sentir, no fundo do coração, que nos entregamos, que nos damos e que concretizamos, que fazemos, que praticamos a Ressureição, que praticamos a fé na Ressureição. Não é apenas uma verdade que anunciamos mas é uma verdade que praticamos. Torna-se não apenas uma ortodoxia, mas também uma ortopraxia, a Páscoa de Cristo, porque nos empenha a fazer coisas.

Aqui é importante sabermos que não há obstáculos, que ninguém está excluído desta tarefa de tornar fecunda a vida, uma vida multiplicada pelo espírito do Ressuscitado.

O exemplo que os Atos dos Apóstolos hoje nos dão é do apóstolo Paulo. Ele que era o rival, ele que era o inimigo, ele que era o perseguidor torna-se o vaso de eleição. Deus pega nele e transforma-o, e torna-o um braço da Sua videira, torna-o um lugar onde a vida acontece, onde a vida jorra, torna-o uma nascente de vida. Por isso nenhum de nós pode dizer: “Ah, estou já demasiado estéril”, “Já é demasiado tarde” ou “Nunca vou chegar isso.” Não, todos somos chamados, permanecendo em Cristo, a dar esse fruto. É o próprio Espírito que conspira com a nossa fragilidade para que essa fecundidade aconteça nas nossas vidas.

Queridos irmãs e irmãos, neste tempo santo da Páscoa nós não estamos apenas a celebrar a Ressurreição de Jesus, nós estamos a celebrar a nossa ressurreição. Estamos a colocar aqui sobre a mesa, como assunto, como questão a ressurreição das nossas vidas, a transformação das nossas vidas.

Esta transformação não é uma utopia, não é apenas uma questão de palavra ou de fé, é uma questão de prática. O que é uma vida ressuscitada? O que é uma vida nova?

Penso que as duas grandes palavras de Jesus que nos aparecem no Evangelho são palavras que temos, de facto, de levar para as nossas vidas. Uma palavra é: permanecer. O desafio a permanecer. “Permanecerei em Mim e eu permanecerei em vós.” Este desafio a radicar, a esconder, a colocar, a ligar a nossa vida à vida de Cristo. E a outra palavra é a palavra “fecundo”, o dar fruto. Há uma exigência que é feita aos discípulos do Senhor. Nós temos de merecer também esse nome. Esse nome é um dom mas também é uma tarefa, também é uma missão. Merecer o nome de discípulo de Jesus.

Acreditemos, queridos irmãs e irmãos, que não há nome mais belo que nós possamos conquistar, não há título de maior luminosidade que nós possamos ganhar na nossa vida do que a de termos sido e a de sermos humildes e fiéis discípulos de Jesus.

Pe. José Tolentino Mendonça, V Domingo da Páscoa

sexta-feira, 23 de março de 2018

Pode a arte converter?

A emoção que experimentamos através da beleza toca em nós fibras extremamente delicadas

Ator, pintor, encenador, escritor, Michael Lonsdale (n. 1931) apareceu em mais de 180 programas de televisão e filmes, entre os quais “Dos homens e dos deuses” e “O nome da rosa”.

Em entrevista ao jornal do Vaticano, L’Osservatore Romano, recorda como as artes foram determinantes para a sua conversão ao catolicismo e consolidação da fé, conta como se manteve firme às suas convicções num mundo difícil para a espiritualidade como é a Sétima Arte e explica por que motivos é tão importante para ele relacionar fé e beleza.

Como nasceu a sua fé católica?
Cresci em Londres até ao verão de 1939, quando o meu pai encontrou trabalho em Casablanca: deviam ser seis meses mas desencadeou-se a guerra e tornaram-se 10 anos. A minha fé nasceu antes de tudo do encontro com uma pintora que um dia me levou à missa na igreja do Sagrado Coração. Nesse tempo não sabia nada de quem era Jesus. Foi ela que me fez descobrir a arte através da atmosfera do seu estudo, e depois com Chagall e Rembrandt: tudo partiu daí.

Mais tarde essa mulher, parisiense de origem, levou-me à capital francesa, encorajando-me a inscrever-me no Ateliê de Artes Sacras, fundado pelo pintor Maurice Denis. Aí, um dia, ouvi uma conferência de um padre dominicano sobre arte e fé: para mim foi uma reviravolta. Entrei em contacto com ele, sem saber sequer como o chamar: «Queria “ativar” a minha capacidade na beleza, o amor, a pureza… e a arte», disse-lhe. Ele respondeu-me: «Talvez seja Deus que estás à procura!». Tornei-me assim seu catecúmeno e fui batizado: tinha 20 anos. O meu padrinho foi um médico judeu convertido ao catolicismo que escapou à deportação. Estava em boas mãos.

Como é que se tornou ator?
Na verdade comecei o teatro ao mesmo tempo. Foi sempre graças à ajuda dos dominicanos que consegui fazer alguma coisa: a incerteza travava-me, não sabia que curso escolher e o meu diretor espiritual enviou-me ao P. Carré, o esmolar dos artistas de então. E Carré, também dominicano, enviou-me para o curso da grande atriz Tania Balachova. Foi ela que me formou, permitindo-me também alargar o meu repertório, tentando recitar também personagens maus, que eu não queria interpretar. Serviu-me muito para o meu personagem de Hugo Drax, no James Bond, por exemplo; devo-lhe muito.

Para dizer a verdade, foi sobretudo a música que me levou para a minha vocação profunda: suscitava em mim um êxtase tão forte que me despertava uma sede de Deus. E a pintura… Rembrandt levou-me à loucura: pintou e gravou tudo o que está na Bíblia. “O regresso do filho pródigo”, em particular, uma das suas últimas pinturas, é absolutamente extraordinária. Em França frequentei a casa de uma tia que era a mulher do escritor Michel Arland. Com ele tive a ocasião de ler muito porque era bastante inculto e, sobretudo, iniciou-me à pintura moderna.

O que é que gosta de pintar?
Não tenho um género predileto. Nunca sei o que vai sair. Um dia comecei a pintar escutando a “Sinfonia pastoral”, de Beethoven: estava de tal maneira arrebatado que a minha mão trabalhou sem que eu me desse conta. No final da música havia vários rostos que não conhecia desenhados na tela. Era como que uma presença, seguramente angélica, que me inspirava.

Como viveu a sua fé no mundo do cinema, que não é particularmente próximo da religião?
Convivi com muitas pessoas, muitas delas estavam atormentadas, inclusive eram violentas. Houve momentos muito difíceis. Mas para mim a missa foi sempre inegociável. Os encontros com o meu pai espiritual e a Confissão apoiaram-me. Com o filme “Dos homens e dos deuses” alcancei um ápice: o personagem do Ir. Luc permanecerá, juntamente com “O nome da rosa”, um dos papéis mais importantes da minha vida. É um modelo absoluto de humanidade, capaz de levar até ao fundo a sua missão seguindo os mandamentos de Jesus. Porque não há maior prova de amor do que dar a vida por aqueles que se amam. E quem se ama é o mundo inteiro.

Empenhou-se muito na vida associativa, através da Diaconia da Beleza ou o Festival Sacro de Cannes, por exemplo; porque é que é tão importante para si relacionar fé e beleza?
Com estas iniciativas tive a liberdade de encenar espetáculos únicos, entre eles a “Vida de S. Bernardino”, que apresentamos cinco anos consecutivos, ao ar livre. Unir-se aos outros artistas para formar uma família espiritual radica-nos ainda mais no coração de Deus. A emoção que experimentamos através da beleza toca em nós fibras extremamente delicadas, em particular com a música. Sou fascinado pela ideia de que ela entra em nós pelos poros da nossa pele primeiro do que pelos ouvidos. Porque é que de repente decidimos que a gama de notas seria o dó re mi fa sol lá si dó? Há uma alquimia misteriosa que é sumamente preciosa… Uma voz desafinada, ao contrário, pode picar-nos como espinhos! No nosso mundo tão tumultuoso temos de preservar este milagre.

Ainda há projetos que gostaria de realizar?
Tantos! Com o meu amigo Robert Hossein queremos encenar uma obra teatral sobre Jesus narrada por Pedro ou Paulo. Está também em gestação um projeto experimental sobre Leonardo da Vinci: deverei ser eu o narrador. Ainda está tudo em fase de projeto mas gostava muito de os realizar…

Solène Tadié In L'Osservatore Romano
Tradução e edição: SNPC
Publicado em 24 de fevereiro de 2018

segunda-feira, 19 de março de 2018

Papa do diálogo e bispo mártir a caminho dos altares

Paulo VI e Oscar Romero vão ser santos

O papa Francisco autorizou esta terça-feira a promulgação do decreto no qual sanciona os milagres atribuídos à intercessão dos beatos Paulo VI (1897-1978) e Oscar Romero (1917-1980), decisão que foi hoje publicamente revelada pela Sala de Imprensa da Santa Sé.

Foi a 26 de outubro de 2017 que os peritos médicos da Congregação para a Causa dos Santos votaram por unanimidade o caso miraculoso de uma gravidez de alto risco que teve desfecho favorável com o nascimento de uma criança sã, atribuído ao papa italiano Montini, primeiro pontífice a visitar Portugal, mais precisamente Fátima.

E foi precisamente nesse dia que os mesmos especialistas decidiram, igualmente em absoluta concordância, a cura milagrosa de uma mulher em perigo de morte após um parto, atribuída à intercessão do bispo mártir salvadorenho.

Oscar Romero foi nomeado patrono da SIGNIS, Associação Católica Mundial para a Comunicação, representada em Portugal pelo Secretariado Nacional da Pastoral da Cultura, pela sua «dedicação e coragem exemplares na defesa dos pobres e dos oprimidos», sendo «um exemplo para todos os comunicadores» e para qualquer pessoa que assuma «os valores que ele ensinou e prefira perder a vida mais do que permanecer em silêncio face à injustiça».

A 14 de dezembro o congresso de teólogos exprimiu o voto positivo para ambos os casos e a mesma resposta foi dada a 6 de fevereiro por parte da sessão de cardeais e bispos.

Reconhecidos os milagres, Paulo VI e o prelado morto por ódio à fé estarão novamente juntos no consistório previsto para a primeira quinzena de maio, no qual o papa, previsivelmente, anunciará a data da canonização.

Convergência e testemunho

A convergência entre os dois futuros santos não é recente. Em 1978, um jornalista perguntava a Oscar Romero se o seu pensamento teológico se apoiava na teologia da libertação.

O arcebispo de San Salvador respondeu que a sua conceção era «igual à de Paulo VI, definida na exortação apostólica “Evangelii nuntiandi” (1975), «sobre a evangelização no mundo contemporâneo».

Dez anos antes, o papa tinha participado na conferência geral dos bispos da América Latina, em Medellin, Colômbia, que reforçou a opção preferencial pelos pobres por parte da Igreja». Na sua encíclica "Populorum progressio" (1967), Paulo VI constatava que «os povos ricos gozam de um crescimento rápido, enquanto os pobres se desenvolvem lentamente».

A memória detalhada da última audiência de Romero com Montini, testemunha da fidelidade ao ensinamento da Igreja, pode ler-se no diário do prelado: «Paulo VI apertou-me a mão direita e teve-a entre as suas duas mãos durante bastante tempo, e eu também apertei com as minhas duas mãos a mão do papa».

«Compreendo o seu difícil trabalho, é um trabalho que pode ser incompreendido e precisa de muita paciência e fortaleza, (…) mas prossiga com coragem, com paciência, com força, com esperança», disse Paulo VI.

Que a proclamação litúrgica da santidade de ambos ocorra no contexto de uma concentração da Igreja sobre as novas gerações, quer aconteça em Roma, no decurso do sínodo dos bispos sobre a fé e a vocação dos jovens, marcado para outubro – como poderá suceder para Paulo VI –, quer se dê por ocasião da Jornada Mundial da Juventude no Panamá, próximo de El Salvador, em janeiro de 2019, como poderia ser para o caso de Romero, em alternativa ao Vaticano, ganha ressonâncias repletas de significados e perspetivas.

Um nexo e uma ligação marcados pelos sinais dos tempos, nos quais o indelével testemunho cristão conjunto do «papa do diálogo», que iniciou o cumprimento do concílio Vaticano II, e do bispo mártir, primeira grande testemunha da Igreja conciliar, ratifica uma trajetória da qual não se pode voltar a trás e que é, mais do que nunca, de premente atualidade.

Stefania Falasca
In Avvenire
Tradução e edição do SNPC , 7 de março de 2018

sábado, 17 de março de 2018

Hildegarda de Bingen

Uma mulher de palavra

Bastaria citar Hildegarda de Bingen (1098-1179) para compreender quão pouco conhecemos do papel da mulher na Igreja e o quanto alguns santos serviram de alimento a gente distante da fé. Vive num tempo de papas e antipapas e consegue, surpreendentemente, subtrair-se ao influente clero de Mainz, oferecendo uma leitura totalmente pessoal do seu tempo.

Hildegarda deixa a abastada Disibodenberg, transferindo-se para uma região rupestre, Rupertsberg, fundando um novo mosteiro. Deste “púlpito” fala a papas e imperadores, entra em diálogo com figuras do calibre de S. Bernardo, permanecendo submissa às legítimas autoridades, eclesiásticas e não.

Apresentando a relação entre homem e mulher com surpreendente liberdade, Hildegarda ensina às suas religiosas a serem antes de tudo mulheres, depois cristãs, depois monjas. Com uma antecipação de oito séculos relativamente a Bonhoeffer (que, aprisionado pelos nazis, afirmava a necessidade de se ser crente, e não religioso), exalta a experiência do crente contra categorias religiosas que sufocam o real conhecimento do divino.

Uma mulher assim não deslizou para análises estéreis da realidade, que nunca levam à salvação, mas propôs uma experiência de vida. Lançou uma proposta nova, num tempo difícil dominado por homens. (...) Foi um desafio para a estrutura política e religiosa do seu tempo. E também não vestiu roupas “modernas” para agradar ao seu mundo em mudança. Permaneceu monja, educando as suas irmãs através do teatro e do canto, a exprimir-se em beleza, santidade e fé. Não lhe faltaram críticas e transtornos, e no entanto hoje é fonte inesgotável de inspiração para leigos e consagrados.

Fazem falta pessoas assim: figuras políticas, masculinas e femininas, figuras religiosas capazes de produzir frutos constituídos por factos, não por palavras. Pessoas de escolhas corajosas e contracorrente que voltem aos princípios fundadores de uma existência humana digna desse nome e de uma política que ofereça ao cidadão a garantia da vida, sã no corpo e na mente.


Gloria Riva, In Avvenire
Tradução e edição: SNPC

quarta-feira, 18 de outubro de 2017

Para não ser demasiado tarde

partilho um testemunho que nos alerta para não perdermos tempo. Seria bom que os pais que não aceitam os seus filhos o lessem. A vida são dois dias...

Até hoje
por João André Costa

"Eu e o Paulo temos uma relação. Pronto, já o disse. Eu e o Paulo sempre tivemos uma relação logo desde o primeiro momento em que nos vimos na Secundária. Ainda retenho a imagem na mente: ele na esquina do Pavilhão A, de calças à anos 90, justas e magras, como as pernas, compridas do chão ao tronco, um tronco elegante, despreocupado, à vontade por debaixo de um rosto calmo, curioso, de olhos negros como o cabelo forte, daquele cabelo que dá vontade de agarrar e encher as mãos, quase animalesco de tão farto. Bastou-nos meio segundo, e depois ele desviou o olhar.

Nessa tarde encontrámo-nos por detrás do ginásio, ele calado e eu também, ele a querer saber, a saber, e eu com as mãos suadas atrás das costas, a tremer, com um pé atrás e outro à frente, ele mais alto que eu, assim ao pé de mim, e eu a percebê-lo mais velho, talvez no 10º ou 11º, e eu ainda no 9º e tantos nervos, nunca tinha beijado ninguém e não queria deixar de beijar, os lábios dele vermelhos de sangue, de dor, vontade, paixão?, amor?, um passo em frente e fechei os olhos.
Até hoje.

Não sei quem teve mais dificuldade em aceitar a nossa relação, se os pais dele se os meus. Quando finalmente arranjei coragem para contar a toda a gente à mesa de jantar, a minha irmã desatou a rir-se, a minha mãe desatou a chorar e o meu pai perdeu a fala.
Até hoje.

E eu a pensar, a ansiar, a desejar tirar este peso de cima dos ombros, eu a querer contar, partilhar este amor, este ardor no peito de coração aos saltos sempre que estivemos juntos e sós, desde o escuro do anfiteatro da Universidade à sala de cinema, passando pela casa quando mais ninguém lá estava até à sala de enfermagem ao fim do turno. Eu a querer dar-lhes tudo e em trinta segundos perder um pai e uma mãe, porque a minha irmã não conta e a minha irmã já sabia (sempre soube) entre amigos e amigas, conversas de rua e conversas de escola. A minha irmã também é enfermeira. Até hoje.

Mas ao menos os meus pais não me puseram na rua. Pura e simplesmente deixaram de o ser, pais, demitindo-se com justa causa e por escrito. Já com os pais do Paulo foi bem pior, e como, mal ou bem, já estávamos os dois a trabalhar, alugámos um T1 no bairro e, aos 21, começámos uma vida juntos.
Até hoje.

Entretanto casámos, pelo Civil, pois claro, o Paulo pediu-me em casamento no nosso 3º aniversário depois de um jantar de mãos dadas e uma vida de mãos dadas e eu disse que sim, para sempre, e para sempre fechei os olhos. Na cerimónia apenas os padrinhos do Paulo e os meus, os que não fugiram, os que não nos deixaram.
Até hoje.

Hoje caminhamos na marcha. De mãos dadas com as alianças bem à vista, para todos, para que todos saibam e todos vejam, o meu pai, a minha mãe (porque a minha irmã não conta, já o disse). E não, pai, eu não trago o rabo à mostra nem penas ou asas de todas as cores, sou apenas eu, eu e Paulo e uma bandeira em cada mão, essa sim com todas as cores, como sempre fomos, de todas as cores desde que o vi na esquina do Pavilhão A. Podia ter sido uma rapariga, foi o Paulo, e eu nunca deixei de ser quem sou, nunca deixei de lutar, estudar e trabalhar, e o que se passa na cama e lá em casa é só connosco e mais ninguém. Não é pai? Porque mais ninguém tem nada com isso e eu também nunca te perguntei o que fizeste com a mãe antes de me fazeres ou enquanto me fizeste.

Estou a caminho de casa e o Paulo vem comigo. Batemos à porta e a minha mãe, com dois poços fundos de lágrimas no lugar dos olhos, abraça-me. Já não vou poder dizer nada ao meu pai."
in Público P3 a 25 de junho de 2017

quarta-feira, 10 de maio de 2017

Deus bem-me-quer

Ou a descoberta de um amor que liberta

Texto escrito a convite de Ricardo Passos para o seu livro "Love Box - A Sagração do Profano"

Os homossexuais não são indiferentes à ideia do Amor: também eles o concebem, experimentam, desejam e vivem. Se para alguns esta afirmação não traz nada de novo, para outros é polémica e provocadora. Poderia falar de muitos países e culturas que, nos dias de hoje, continuam a ignorar os direitos universais do ser humano ao torturar, criminalizar, perseguir e matar homens e mulheres pelo simples facto de serem homossexuais. Mas, mesmo em sociedades que fizeram avanços em questões de igualdade de tratamento, reconhecimento, legislação e defesa dos direitos de pessoas LGBTI (lésbicas, gays, bissexuais, trans ou intersexuais), o preconceito, a discriminação e o desconhecimento – para não dizer ignorância – estão longe da extinção (tal como a abolição da escravatura não erradicou o racismo e a xenofobia e as leis de igualdade de género não fizeram desaparecer o sexismo e o machismo da sociedade).

Em 2010 saiu na revista do jornal Público uma reportagem de Alexandra Lucas Coelho sobre uma realidade pouco conhecida e pouco falada em Portugal: os cristãos praticantes que são homossexuais. Um homossexual cristão vive neste ingrato limbo de ser considerado “bastardo” ou “profano” tanto pela Igreja como pela comunidade homossexual: na subcultura gay é visto como incompreensível, bizarro e incompatível que se possa ser crente, no meio eclesial católico (e no de outras confissões cristãs) é inaceitável e inconcebível que alguém se assuma e “viva como” gay.

Com vista a preparar esse trabalho a jornalista quis entrevistar-me. O contacto foi feito através de uma amiga que, conhecendo a minha condição homossexual, sabia que eu não abandonara a fé e a participação na vida da Igreja, nomeadamente num grupo de reflexão formado por gays cristãos. Ao ser entrevistado pela Alexandra apercebi-me que era urgente deixar uma porta aberta para homossexuais que viessem a ler a reportagem e, sendo cristãos, não tivessem a “sorte” de terem percorrido – ou encontrado alguém que os ajudasse a percorrer – um caminho de fé onde as dimensões da sua sexualidade e afectividade fossem bem integradas. Decidi então criar o blogue “Moradas de Deus”, que tem como subtítulo “um blogue para cristãos homossexuais que não desistiram de ser Igreja”. Os leitores podem aqui encontrar informação, ferramentas, e publicações relativas a uma questão que, apesar de ser muito pessoal, tem repercussões sociais e gera grande sofrimento e isolamento em muitos e muitas dos que vivem esta dupla condição de ser homossexual e crente.

Como chegar a este ponto de pacificação em que deixa de haver um combate constante e uma medição de forças entre consciência e razão? O que hoje é claro para mim, nem sempre o foi. Todos já teremos ouvido a frase “Ama a Deus acima de todas as coisas e ao próximo como a ti mesmo”. Foi Jesus quem resumiu nesta frase os mandamentos do Antigo Testamento, espelhando nesta forma tão “destilada” uma métrica pela qual a vida de qualquer cristão se deve reger. Mas amar ao próximo como a nós mesmos pressupõe que nos amemos a nós mesmos... Quanta gente vive esta angústia de não se amar a si mesmo?

Na minha experiência, a interiorização deste “ama ao outro como a ti mesmo” começou por uma descoberta simétrica: “ama-te a ti mesmo como amas ao outro”. Posso assumir que o meu caminho de auto-aceitação e de descoberta do auto-amor começou muito naturalmente pela aceitação dos outros, do Outro, da sua diversidade e da sua particularidade. Quando, na vida quotidiana, se vai “trabalhando” a receptividade face ao Outro, aceitando-O como é – abdicando de desejar que seja como nós queremos – a aceitação das suas características (aquilo que lhe é característico) torna-se evidente e natural. A homossexualidade será apenas uma das muitas características dessa pessoa.

Para um homossexual, amar-se a si mesmo passa invariavelmente pela aceitação da sua própria condição homossexual ou homoafectiva que, idealmente, o leva a viver a sua sexualidade de uma forma mais integrada e saudável – deixa de viver em negação ou reprimido, dominado pelo medo, sentimento de culpa ou vergonha. A aceitação da minha própria homossexualidade foi um percurso longo e menos evidente do que a aceitação da homossexualidade nos outros. Passou pela aceitação da minha totalidade, como um Ser totalmente criado e amado por Deus – se Deus é criador e me ama, não terá criado nem escolhido amar apenas uma parte “conveniente” de mim. Ocorreu uma espécie de “conversão”: outrora o meu amor por Deus surgia ainda toldado e limitado pelo receio e por escrúpulos, agora manifesta-se no próprio acolhimento e descoberta do Seu amor incondicional, completo, inclusivo e libertador. Foi fazer a transição entre um conceito fundado na minha própria capacidade ou incapacidade, força de vontade, fraqueza e estoicidade – uma atitude que, contrariamente ao que seria expectável, era pouco receptiva à Graça e à transcendência de Deus – e uma abertura radical a este amor gratuito e generoso de Deus. Um amor completo, fecundo e pleno, que sacia, sem condições, um amor por tudo aquilo que eu sou – alma, espírito, razão, sensibilidade, afectividade, corpo, sexualidade... Um amor que se incarna em mim, que não aprisiona, que me deixa voar, que quer que eu seja. Compreender este amor de Deus, levou-me a tentar amar-me como sou e não como idealizava ser, permitiu-me passar do plano das ideias e dos ideais para o plano da realidade. Saber que sou amado por Deus torna-me, assim, mais real. E este amor torna-me livre.

Muitas vezes, nesta etapa do caminho do auto-reconhecimento, um homossexual cristão depara-se com uma realidade visível da Igreja que não corresponde exactamente à sua vocação primordial de Mãe que congrega, ama e acolhe. O discurso mais oficial da Igreja é omisso, moralista, obcecado pelo carácter genital do acto sexual e alheado da riqueza da afectividade, do cultivo de um amor e da construção de uma vida em comum entre duas pessoas homossexuais. A voz da Igreja que mais se faz ouvir soa a inflexível, desrespeitadora, castradora e arrogante. E é aqui que um homossexual cristão se vê a repensar a pertinência de permanecer na Igreja. Muitos decidem então afastar-se, por sentirem que não são integralmente amados, queridos, estimados, escutados, apoiados, incluídos e acolhidos.

No meu caso nunca pesei seriamente esta questão. Sou crente e valorizo ter sido dotado de inteligência e de sentido crítico: procuro viver de forma esclarecida e consequente. Há muito que compreendi que a minha maior responsabilidade não é estar na Igreja, é ser Igreja. Eu preciso tanto da Igreja quanto ela precisa de mim, de todas as minhas características, dons e talentos. Sem mim a Igreja ficaria mais pobre, menos criativa, menos solidária, menos alegre, menos cultural, menos sensível, menos activa, menos inquieta, menos curiosa, menos exigente, menos aberta, menos acolhedora, menos artística, menos comunicativa, menos contemplativa, menos prática, menos gay... Faço falta à Igreja e, felizmente, vou tendo confirmações disso.

Em Portugal há padres e freiras que acompanham pessoas homossexuais cristãs. Enquanto os documentos oficiais da Igreja vão a passo de caracol, vão-se multiplicando as intervenções de figuras da hierarquia e de teólogos que incitam a uma urgência, seriedade e aprofundamento na reflexão sobre estas matérias. Termino com a tradução de alguns parágrafos da página de Internet da arquidiocese de Los Angeles, que me parecem ser uma lufada de ar fresco ao abandonarem o tom moralista do discurso da Igreja – que subestima e profana a dignidade dos cristãos homossexuais e a sacralidade do seu amor:

“Dentro da nossa Comunidade Católica existem muitas pessoas que são gays e lésbicas […] A Igreja ensina que uma orientação lésbica ou gay, por si só, não é pecado. Qualquer católico(a) que descobre que é lésbica ou gay continua a ser membro da Igreja e é chamado a participar na vida paroquial como qualquer outro católico. A pessoa que é gay ou lésbica não é menos que outro membro da Igreja e é chamado(a) a participar nas alegrias, dificuldades e desafios dos ensinamentos católicos sobre a sexualidade humana. A Igreja lamenta os distanciamentos e afastamentos que lésbicas e homossexuais experimentaram. O nosso ministério procura “aliviar” mal-entendidos ou diferenças e procura construir uma ponte de entendimento e de apoio para lésbicas e gays, suas famílias e seus amigos. […] Respeitaremos os seus direitos de privacidade e acolhê-lo(a)-emos como acolheríamos a Cristo.”

Rio Azur, autor do blogue Moradas de Deus

terça-feira, 21 de março de 2017

Entrevista com Pádraig Ó Tuama

Poeta, Teólogo e Gay

Uma leitora do moradasdedeus partilhou esta entrevista da "On Being Studios". A americana Krista Tippet entrevista Pádraig Ó Tuama, um poeta e teólogo irlandês, actual responsável da Corrymeela Community (uma organização cristã e ecuménica que trabalha pela paz e pela reconciliação) que, a propósito do seu mais recente livro "In the Shelter: finding a home in the world", aborda temas tão diversos como o medo, a arte de viver, a sua história de vida pessoal, o catolicismo, o casamento entre pessoas homossexuais e muito mais. A entrevista está em inglês: para ouvi-la basta seguir o link abaixo e fazer "Play" sobre o número 5.


Para conhecer mais sobre a história de Corrymeela e o posicionamento de Pádraig Ó Tuama em relação ao casamento homossexual, leia AQUI

terça-feira, 14 de março de 2017

Uma história de bullying

Partilho este texto de Leonardo Rodrigues, escrito na primeira pessoa, por abordar um assunto que ressoa em muitos de nós:

Quando foi comigo, o paneleiro

Existem dias em que com muita esperança, talvez presunção, penso "já passou", que, enquanto adulto, está tudo bem, que não voltarei a sentir isolamento, que não vou olhar o mundo e pensar que está contra mim e que já fiz o percurso que tinha de ser feito. Está mais perto, mas sair do armário, como lhe chamam, faz apenas parte do início da caminhada.

Há muito que queria escrever este post e dizia-me não ter as palavras certas, quando na realidade não existem palavras certas para dizer que enquanto crescia, algumas pessoas, motivadas pelo que outras lhes incutiram como sendo certo, me fizeram sentir errado, sujo, mau, feio, vergonha. Sem que ainda soubesse àquilo a que se referiam ou quem era.

Amigos que se mantêm próximos não têm memória. Quem me infligiu dor física e psicológica talvez também não. Eu sim, e agora estou em condições de partilhá-la. É um exercício duro deixar-me guiar pelas memórias que não quero lembrar e sentimentos que não quero sentir, mas é isso que faço convosco hoje. Porque este blog é sobre mim, as coisas boas e más, e o que aprendo com elas. Porque este blog, seja de que forma for, é para outros lerem.

O bullying começou na mesma altura em que me apercebi que era diferente, tinha eu uns oito anos. Diferente, aos oito, era tudo o que sabia. Não conhecia palavras para associar à diferença. Não sabia que parte da minha família e comunidade me viam como algo de mau, a precisar de tratamento ou de morrer, como cheguei a ouvir.

Antes de sequer ousar expor o que pulsava cá dentro tudo mudou. O meu melhor amigo passou a chamar-me várias coisas menos Leonardo. Paneleiro e "escabaçado" - seja lá isto o que for - eram as mais constantes. Não sabia o que era, mas já mo apontavam, pejorativamente. Ser isso, "padecer" disso, era mau. Essa palavra, nova no meu vocabulário, tinha muito poder - para todos menos para mim: fazia com que me batessem nos intervalos, com que não pudesse usar o computador nas aulas de informática e que cascas de fruta voassem para a minha sopa.

Lembro-me dum episódio em particular, estávamos no intervalo, enquanto um colega me agarrava, outro apertava o pescoço e outro dava pontapés. Gritei o mais alto que pude olhando para alguém responsável, que me devolvia o olhar sem nada fazer. Talvez porque "éramos só crianças a brincar". Aí entendi que quem me poderia proteger não o ia fazer, que estava por minha conta e passei a ter medo do que era o meu lugar favorito, a escola.

A vergonha e o medo manifestavam-se, além das lágrimas, numa dor de cabeça, acompanhada de um formigueiro. Não tinha apetite e implorava que me deixassem ficar em casa. A minha mãe esforçou-se para entender. Como é que alguém que sempre quis estar na fila da frente, com excelentes a tudo e amigos de repente não quer sair de casa? Também ao psicólogo senti que precisava mentir. Quando contei parte do que acontecia foi pior. Mentir deu-me um conceito ridículo de proteção: calar para apanhar menos.

Éramos, sim, crianças. Mas há algo que todos precisamos compreender: as crianças são uma tábua rasa. Se o que lá for escrito for mau, elas irão agir de acordo com isso. Se lhes ensinam violência elas vão perpetuá-la. Se lhes ensinam a odiar é ódio que vão sentir. Da mesma forma que, quando envolvidas em amor e respeito, o reproduzem infinitamente, da forma bonita como só elas sabem.

No 5º ano, como íamos para escolas diferentes, achei que tudo ia mudar. Os primeiros meses foram fantásticos, conhecimentos e amigos novos, vida nova. Mas claro que "isto" me iria sempre apanhar, fosse como fosse. Uma professora para me mandar calar, a mim e a um amigo, disse para pararmos de estar aos beijinhos. Ainda hoje não entendo. Só beijei um rapaz pela primeira vez aos 18. Num meio pequeno, numa escola, não importa que não fosse verdade. Comentou-se fora da sala e tudo mudou novamente, durante anos. Estava marcado por uma suposta demonstração de afeto.

Achei que a história se iria embora, como as notícias vão, mas não. Os dias de medo regressaram, mas agora ia lidar com muitos mais, de todas as idades, numa escola grande, onde achavam por bem bater e insultar por algo que ainda não compreendia. As dores de cabeça e o formigueiro voltaram. Tomei as medidas possíveis: sentar-me no início do autocarro - os machos curiosamente preferem a parte de trás; deixei de entrar na escola pela entrada principal e ia sempre por detrás dos pavilhões. Havia menos pessoas, parecia mais seguro. Parei de comer na cantina, situações menos boas ocorriam lá. Isso não foi suficiente. Durante anos que não foi.

Na escola faziam sempre festas no final do período e ocasiões especiais. Numa dessas, atiraram-me papéis durante todo o evento. Deixei de ir às festas. Num dos cortejos de carnaval atiraram-me pedras. Deixei de estar presente. Os intervalos eram oportunos para essas coisas, então comecei a ficar dentro dos pavilhões.

Comecei também a riscar os dias num calendário que guardava na carteira. Contava as faltas que podia dar, os dias piores, os feriados, os fins de semana. Sozinho.

Acho que até aos 12 todas as manhãs acordava na expetactiva de ter mudado, mas bastava-me chegar à escola para olhar para um rapaz e saber que era um olhar diferente. Achei que não podia ser amado se fosse assim. Cheguei ao ponto de rezar para que se fosse embora, mesmo já não acreditando num deus que cria alguém de uma forma e depois castiga. Não foi embora, não podia, nem tinha.

Há um outro episódio antes do secundário que me marcou. Abriu um bar na terriola e fui sair à noite pela primeira vez com os meus amigos. Um rapaz "popular" agarrou-me, apalpou-me e disse-me coisas terríveis. Hoje, embora racionalmente saiba que está tudo bem, sair à noite e pensar em sair causam-me ansiedade.

As aulas de educação física eram as piores. É cliché, mas era péssimo em futebol. Os rapazes tinham que jogar futebol. Um rapaz que preferisse jogar volley não podia, uma rapariga que quisesse jogar futebol podia. O professor que tive durante anos, assumidamente homofóbico, tinha uma metodologia de ensino peculiar: "joguem futebol"; beliscar as raparigas, olhar-lhes para o rabo e conversar com os favoritos. Havia uma certa discriminação na avaliação. Estudava e sabia as matérias, tanto para história como para educação física. Curiosamente, a história tinha 19 e a educação física chegar à positiva era complicado. Na parte prática, uma rapariga pior tinha 15, eu nunca mais do que 14.

Aos 18 anos, a fazer algo que de forma simples se chama terapia disse pela primeira vez que era gay. A sessão demorou 3 horas porque só após chorar durante este tempo, depois de me ter sido servido um gin e um whiskey - sim isto aconteceu mesmo - é que consegui abanar a cabeça. Demorei tanto tempo porque achava que me iria querer suicidar, que não aguentaria a vergonha se alguém soubesse. Em vez disso fui recebido com um sorriso e um abraço. 

Não sei bem o que tem de ser feito, mas o problema é muito profundo. As "vítimas" nem sempre denunciam, e por vezes suicidam-se. Na ausência de uma denúncia por parte da vítima, poderiam ser os colegas. Os colegas por vezes "não vêem", não têm de ser homofóbicos, racistas e afins, podem só ter medo. É difícil ir contra os estabelecido. Resta-nos os professores, mas esses conseguem ser piores. Parece popularucho ou demasiado português dizer isto, mas é verdade.

Quando via pessoas na minha situação e não conseguia fazer nada, sentia-me impotente. Por vezes até tentava gozar, acho que era homofóbico. Falei há uns tempos com um colega que passou algo semelhante na escola e lamentei não ter sido capaz de intervir. Ele disse que não importava e até me confessou que fui das primeiras "crushes" dele. Saber isso foi emocionante para mim. Numa altura em que eu tinha repulsa de mim, havia alguém que reparava. Há sempre alguém.

Nem sempre estive consciente, mas hoje sei que gosto muito de mim. As feridas são quase cicatrizes porque tenho vindo a entender que não seria quem sou sem um passado. E, ser gay não faz de mim menos homem nem é tudo o que sou. Até as emoções menos boas levaram-me a olhar as coisas com outros olhos e aguçou-me o sentido de humor. A honestidade só trouxe vantagens. Não só me permitiu manter as minhas amizades, como possibilitou que as mesmas se fortalecessem e multiplicassem. Permitiu-me amar e ser amado, construir algo com alguém. Permitiu-me ser livre.

A vida é cada vez mais plena porque tenho deixado que permaneça em mim um "e se?", porque me deixei guiar pela imaginação, por curiosidade relativamente a outras vidas. Espero que quem leia, independentemente da vida, cor, peso, ou orientação sexual, se pergunte, com vista ao futuro "e se?" e veja todas as combinações possíveis.

Ler em Leonismos

quinta-feira, 27 de outubro de 2016

Um testemunho no mês de oração pelos missionários

Isa Solá

Dois disparos. Queriam roubar-lhe a bolsa e atingiram-na à queima-roupa enquanto se dirigia para o automóvel, em Port-au-Prince. Homicídio acidental, mas que fala da luta, no Haiti, pela sobrevivência a todo o custo, relativizando o valor da vida por um punhado de dólares. Um assalto interrompeu a obra de Isa Solá. Religiosa de Jesus e Maria, nascida em Barcelona há 51 anos.

Poderia ter sido tudo aquilo a que se tinha proposto. Poderia ter sido a primeira. Mas preferiu estar junto dos últimos. Por isso deixou a sua casa aos 19 anos para dizer um sim incondicional. Estudou enfermagem e magistério e depois dedicou-se à missão, primeiro como professora, em Valência, depois na Guiné Equatorial e, por fim, num instituto para menores em Barcelona. Em setembro de 2008 aterrou em Port-au-Prince, poucos meses antes do terrível terramoto.

Viu a escola em que trabalhava ruir em apenas 20 segundos. Viu o país mais pobre da América desaparecer entre os escombros. Enérgica, imparável, participou na reconstrução. Antes tinha trabalhado no ambulatório de ortopedia para dar uma segunda vida aos mutilados e às vítimas graves do sismo. Depois numa clínica móvel par assistir os mais pobres entre os pobres. E, finalmente, numa escola, um projeto emergente que sem ela ficou órfão.

Não procurava protagonismos. Tomava a iniciativa mas depois colocava-se de parte. Com efeito, deu início quer ao ambulatório quer à clínica móvel com médicos locais, para que fossem eles a tomar as rédeas, para que os próprios haitianos tomassem as rédeas do seu presente e do seu futuro. Para lhes voltar a dar um pouco de dignidade em tempos de escravidão.

Enamorou-se do povo haitiano, da sua enorme força diante dos sofrimentos. Talvez se visse refletida nele como num espelho. Irrequieta, decidida, apaixonada. De Deus. O seu olhar sempre sorridente demonstrava-o, esse mesmo olhar que o papa Francisco, este domingo, pediu a todos os cristãos, parafraseando a nova santa de Calcutá. Isa era uma outra Teresa e Port-au-Prince a sua cidade da alegria.

Isa Solá sabia que pisava terreno pouco seguro. Jogava a vida a cada dia, como qualquer outro missionário, como qualquer outro haitiano. Mas nunca pensou abandonar. «Deus nunca deita a toalha ao chão, nem eu quero fazê-lo», disse-me há pouco mais de um ano, na última entrevista que me concedeu. Voz de anúncio, com a guitarra na mão, e de denúncia, diante das injustiças. «O Haiti precisa de menos corrupção, de um governo mais organizado e de prioridades claras. Há tantas ONG que se enriquecem com a miséria, é evidente.»

Tinha regressado há apenas duas semanas de Espanha, onde tinha visitado a sua família e a sua comunidade de origem. Tinha-se despedido delas. Para voltar ao Haiti, para continuar a sua profissão de fé. «Deus impassível? Nunca na minha vida vi Deus mais presente e ativo. Gritei de raiva e de dor quando me vi rodeada de mortos após o terramoto, e eu estava viva. Depois tive o privilégio de ser testemunha de muitos milagres. Os haitianos tornam-me mais crente e pedem-me todos os dias para ser coerente com a minha fé. Missionária, eu? Não. Não sei quem evangeliza quem.» É este o credo de Isa Solá.

José Beltrán Aragoneses in "L'Osservatore Romano", 5 de Setembro de 2016
Tradução de Rui Jorge Martins publicada em 6 de Setembro de 2016 no SNPC

quarta-feira, 26 de outubro de 2016

Carlos de Foucauld, uma lição de gratuidade

O pequeno Charles

Transcrevo um belo texto sobre um grande homem da Igreja e do Mundo

"Desde o primeiro momento em que vi o seu rosto, há mais de 30 anos, percebi que Charles de Foucauld haveria de ter, de uma maneira ou de outra, grande importância para mim. Todos desejamos deixar, com o nosso pensamento e a nossa ação, uma marca neste mundo: criamos famílias, escrevemos livros, fundamos instituições... Poucos, os imprescindíveis, deixam a marca da sua passagem sobre a Terra graças à sua contemplação e à sua paixão. Charles de Foucauld foi sem dúvida um deles. Mais do que fazer, e no entanto fez muito, deixou-se fazer; mais que pensar, e pensou muitíssimo, esvaziou-se a si próprio ao ponto de não ser senão pura recetividade.

O seu rosto, terno e vigoroso ao memo tempo, vincado pelo rigor e da indulgência, é seguramente um espelho fiel da sua alma. Foucauld fez da sua vida uma obra de arte, ou seja, um testemunho eloquente da gratuidade. (...) O rosto deste eremita e missionário reflete a alegria e a gratidão que são os sinais inconfundíveis do verdadeiro amor.

Para mim Foucauld é um padre do deserto contemporâneo (...) A fonte de onde beberam aqueles padres do deserto e que depois deu vida ao movimento hesicasta é a mesma da qual bebe o irmão Carlos, cuja missão - esta é a minha tese - não foi a de fundar algo de radicalmente novo, mas de re-inaugurar para o Ocidente uma via contemplativa que no Oriente cristão não tinha conhecido solução de continuidade, em particular na república monástica do Monte Athos. Na minha visão, Foucauld recebe o colossal encargo de recuperar aquela milenária tradição de sabedoria e de a atualizar. É por isso que a sua obra, sempre do meu ponto de vista, está ainda no estádio inicial. No atual século e nos vindouros dar-nos-emos conta muito melhor da relevância da sua figura e do alcance da sua missão.

Para ilustrar a minha tese tomo sete palavras que, a meu ver, refletem mais integralmente o contributo daquele que chamamos "irmão universal": procura, consciência, deserto, adoração, nome, coração e fracasso. Com elas pretendo não só dar conta das categorias fundamentais que orientaram o nosso personagem, mas também indicar as razões da sua atualidade.

Procura

Um olhar superficial pela biografia de Foucauld (a meta das suas viagens, os hábitos e os uniformes que vestiu, as pessoas de quem se rodeava, as casas que habitou...) é suficiente para constatar que a vida deste homem foi realmente insólita. Foucauld não se assemelha a ninguém. A sua vida foi um contínuo peregrinar. Dizia de si, na segunda das diversas épocas, que queria ser monge ou eremita; o que é certo é que viajou muitíssimo, que se estabeleceu em lugares diferentes, que foi um peregrino estrutural. Tais mudanças de horizontes, geográficos mas sobretudo existenciais, as metamorfoses constantes que o levaram a ser hoje explorador travestido de judeu e amanhã autor de um dicionário tuaregue, hoje soldado do exército francês e amanhã jardineiro de alguns monges em Nazaré, realçam o seu constante estar à procura. Foucauld não cessou de responder ao chamamento do seu eu profundo, onde fosse que Deus o chamasse.

Foucauld, como Gandhi ou Simone Weil a outros níveis, fez da própria vida uma autêntica e contínua experimentação. Encontramos a razão nas palavras seguintes.

Consciência

Um olhar mesmo superficial aos escritos de Charles de Foucauld, sobretudo diários espirituais e cartas, faz-nos compreender como ele atravessou a vida escrutinando a própria consciência, entrando nas motivações dos próprios atos, revendo as intenções, examinando minuciosamente o mínimo detalhe, como tinha aprendido de Santo Inácio, projetando sonhos com os quais dar corpo a uma intuição, observando-se no espelho de Jesus Cristo, o seu Bem-amado, estudando o que seria mais aconselhável e oportuno, censurando-se as falhas, agradecendo os dons recebidos, louvando por tanto bem e bondade, programando o impossível... Foucauld, que na juventude foi soldado, não cessou de o ser plenamente na maturidade. Não era apenas um enamorado, é inútil dizê-lo, mas também um estratega, alguém que projeta o próprio dar-se: que reforça os lados mais fracos, que traça planos para dar fecundidade ao seu ingovernável amor. Foucauld percorre um grande número de dias e de horas na mais rigorosa solidão e no mais estrito silêncio. É neste terreno de cultura que aprendeu a escutar. O aspeto mais surpreendente da sua personalidade é que não escutou simplesmente a si próprio e, por esta via, Deus e os outros, mas que obedecia às vozes que escutava e, ainda mais, que fez de tal escuta e obediência um estilo de vida: sempre a escutar e a obedecer, sempre dentro da aventura de ser si mesmo. Reconhecendo sempre que era ele a melhor palavra, melhor, a única, que Deus lhe tinha concedido.

Deserto

Foi este o cenário privilegiado da escuta permanente, uma escuta quase assustadora, de Charles de Foucauld. E não por acaso. Foucauld converte-se na África do Norte, surpreendido pela extraordinária religiosidade dos muçulmanos. Entende o deserto em primeiro lugar em chave metafórica, por isso experimentou ser monge inicialmente na região de Ardèche, em França, depois em Akbés, na Síria, portanto na Terra Santa; mas não tardou a regressar ao deserto do Sara, o da sua juventude, o seu amado Marrocos e a sua desejada Argélia. O destino e a Providência marcaram-lhe lá encontro. Os fenomenólogos e os historiadores das religiões realçaram como o Médio Oriente foi o principal berço das religiões. Não penso apenas nas tradições monoteístas - judaísmo, cristianismo e islão - que claramente lá têm o seu tronco, mas também nos fenícios, babilónicos, egípcios... Para aquelas terras também se dirigiu o nosso Foucauld, talvez porque poucas regiões da Terra como essa, na sua desolação, sabem evocar o mundo interior e a ele o remeter com tanta força. O vazio externo, portanto, como incitamento àquela obra de esvaziamento que no cristianismo chamamos esquecimento de si ou pobreza espiritual. O deserto como lugar da vitória sobre a provação ou, que é o mesmo, como descoberta da sarça ardente ou chama de amor viva a que se acede para além da noite escura do abandono e da solidão.

Foucauld voltou ao deserto como fez Israel ao sair do Egito ou como fez o próprio Jesus Cristo pouco antes de dar início ao seu ministério público. Por isso Foucauld é, para mim, um novo Moisés, mas sem povo, ou com um povo invisível. Ou um novo e amoroso Jonas que prega na sua Nínive. Foucauld é um pró-memória permanente de como não há caminho espiritual sem deserto e purificação.

Adoração

No meio do deserto, espelho da sua consciência e território das suas procuras, Foucauld adorava. É uma palavra que hoje nos soa estranha, mas adoração significa, simplesmente e linearmente, que o homem não se realiza sobre a via do ego, mas quando sai do próprio micromundo e vence essa tendência tão nefasta e generalizada que é a posse e a autoafirmação. Adorar quer dizer apenas parar de viver a partir do pequeno eu para ceder o passo ao eu profundo, onde habita o hóspede divino. A adoração, ou oração contemplativa, é a única medicina para a idolatria do eu. «Ao Senhor, teu Deus, adorarás: só a Ele prestarás culto» é a resposta de Jesus à última tentação com que o diabo o prova. Hoje poderemos traduzir: tu não és o centro do mundo, sai de ti mesmo. E é quanto Foucauld fazia dia e noite, durante horas e horas sem interrupção, de joelhos diante do seu pequeno tabernáculo, cheio ou vazio. Foucauld corre o risco da solidão e da diversidade como poucos outros homens e mulheres do nosso tempo. O risco de se perder definitivamente.

Como poucos atravessou o muro de silêncio que lhe pôs diante de si a sua miséria e que, depois de anos de luta, o conduz a uma doce, íntima certeza. Quer o saibamos ou não, todos aqueles que estão á procura têm - temos - em Charles de Foucauld um mestre insigne. Amou muito porque calou muito. Hoje nós falamos dele porque se esvaziou de si.

Nome

Esta adoração, esta nudez absoluta cada vez mais radical, esta peregrinação ao próprio centro em que se encontra o templo da verdade, Foucauld levou-a ao termo, à maneira dos padres do deserto um milénio e meio antes, como uma arma tão simples quanto eficaz: o doce nome de Jesus. Poucos homens na história como Foucauld deixaram um testemunho escrito tão eloquente do seu apaixonado amor por Jesus de Nazaré. Ao abrir qualquer um dos seus diários e qualquer uma das suas páginas encontrar-se-á sempre, sempre, expressões incendiadas por um ardor quase insuportável: «Amo-te, adoro-te, quero dar-te tudo, quanto me amas, quanto te amo, dou-te graças, entrego-me nas tuas mãos, faz de mim o que quiseres, louvo-te, meu Bem-amado...». O nome de Jesus acompanhou-o, como um incessante mantra, durante quase todos os minutos da sua vida. Foucauld era um louco de amor, um apaixonado deste nome. Alguém que deixou que o nome, e a pessoa que ele evoca, o possuíssem.

Isto significa que a solidão na qual Foucauld viveu, por quão dura pudesse às vezes ser, era uma solidão acompanhada. E que o seu silêncio era sonora, por quão doloroso pudesse, muitas vezes, ser para ele. Uma só palavra explica a incrível vida de Charles de Foucauld: Jesus.

Coração

O nome de Jesus, incessantemente repetido, invocado, sonhado, escrito em centenas de milhares de páginas, radicou-se progressivamente na sua consciência e no seu coração, finalmente unidos naquilo que poderemos chamar o coração consciente, e que eram o lugar no qual tal Presença residia. A certo ponto da sua vida, esmagado por tanto amor, Foucauld cozeu um coração vermelho no seu hábito branco, dando uma clara prova de como aquele coração o tinha atado. Foucauld foi certamente um sentimental, mas no interior de uma personalidade poliédrica de incomparável riqueza. Ainda que a sua fosse uma vocação à oração contemplativa e silenciosa, nunca abandonou a oração afetiva, alimentada por palavras e imagens que a mantiam acesa.

Praticou aquela que os hesicastas chamam a custódia do coração: sentir a vida, oculta e frágil, em cada palpitação; sentir a Vida com maiúscula nesta nossa vida, tão limitada e intensa, tão humana e tão divina.

Fracasso

No termo da vida, pouco antes de ser assassinado, Foucauld encontrou-se - serviram-lhe décadas inteiras para chegar a isto - com as mãos felizmente vazias. Poder-se-ia dizer que ao longo da sua existência recolheu um fracasso após o outro: último da sua classe no exército, no qual esteve várias vezes para ser expulso por causa dos seus escândalos e indisciplina. Fracasso também como patriota e fez abortar a sua vocação de explorador, atirando às urtigas uma brilhante carreira profissional. Monge fracassado na trapa de Cheikhlé. Resultou também em nada o seu quimérico de adquirir o Monte das Bem-aventuranças para aí se estabelecer como eremita. Inútil também como simples ajudante ou doméstico. Nem uma só conversão em tantos anos de apostolado.

Nem sequer um seguidor depois de ter redigido tantos esboços de Regra para os eremitas que projetava. Ignorado pela administração civil como pela eclesiástica, não teve junto a si nem um escravo libertado nem um companheiro para a sua missão... Foucauld é um dos mais conseguidos ícones do fracasso. Porque preferiu os últimos lugares aos primeiros, a vida oculta à pública, a humilhação à elevação.

Por tudo isto, Foucauld é a imagem em que podem reconhecer-se todos os fracassados da história. E por tudo isto vejo as pessoas do mundo caminharem muitas vezes para uma direção e Foucauld na oposta. Não é, todavia, o único; há outros com ele, todos solitários, todos loucos. E o primeiro desta fila é o próprio Jesus Cristo, o mais louco de todos.

Termino este léxico de Foucauld com uma nota pessoal. Em maio de 2014 fundei na minha cidade a associação "Amigos do Deserto", uma rede de meditação, com crentes e não crentes, interessados no aprofundamento e na difusão da experiência do silêncio a partir da tradição espiritual do hesicasmo. Desde então quase um milhar de pessoas foram iniciadas, em diversos pontos da geografia espanhola e europeia, à oração do coração. E todos, numa ocasião ou noutra, muitos diariamente, recitamos as palavras que Foucauld, verdadeiro fundador destes Amigos do Deserto, deixou escritas como testamento: 

«Pai meu, eu me abandono a ti. Faz de mim aquilo que quiseres. O que quer que faças de mim, eu te agradeço. Estou pronto para tudo, aceito tudo, desde que a tua vontade se cumpra em mim e em todas as tuas criaturas. Não desejo nada mais, meu Deus. Entrego a minha alma nas tuas mãos, dou-ta, meu Deus, como todo o amor do meu coração, porque te amo. E é para mim uma exigência de amor o dar-me, o entregar-me nas tuas mãos sem medida, com uma confiança infinita, porque tu és o Pai meu». 

Quanto escuto esta oração, às vezes proclamada em uníssono por centenas de Amigos do Deserto, sinto subir em mim uma profunda ação de graças e compreendo, como nunca, que não basta uma vida para ver os frutos de uma sementeira.

Pablo d'Ors
In "L'Osservatore Romano", 19.9.2016
Traduzido por Rui Jorge Martins e publicado a 20 de Setembro de 2016 em snpc

segunda-feira, 4 de abril de 2016

O homem que eu amo: a love story

Quase todos os filmes, livros e referências que temos de vida conjugal feliz e duradoura dizem respeito a casais heterossexuais. O Jornal Público, em 2012, publicou uma entrevista ao cientista Alexandre Quintanilha e ao escritor Richard Zimler que, generosamente falaram sobre uma história de amor e de vida em comum que partilham há 39 anos.




por Anabela Mota Ribeiro, a 11 Nov 2012

Excertos da Entrevista:

Muito mais do que um rótulo: o inesperado de uma paixão
(...)
A.Q. - Os meus pais não eram nada preconceituosos. Não disse que era gay, não existia essa expressão quando tinha 16 anos. Disse aos meu pais que estava apaixonado por um homem e que não percebia. Não havia role models [exemplos] para isso. O meu pai disse-me que não era uma coisa que ele percebesse, mas que se isso me preocupava podia arranjar uma pessoa com quem eu pudesse falar. E fui falar com um psiquiatra, duas vezes. (...) Na primeira vez em que estive com esse homem extraordinário, dei-lhe a ler um diário meu. Estava convencido de que era uma obra-prima da literatura [riso]. Na sessão seguinte, entregou-mo e disse: "Você está apaixonado. Isso é uma sensação maravilhosa. Devia estar satisfeito por estar apaixonado." Eu não tinha a certeza se era mesmo gay ou se era bi. A minha mãe, a única coisa que me disse foi: "Quero é que sejas feliz."
(...)

Olhando retrospectivamente, acha que se apaixonava de facto por homens e por mulheres ou estava a tentar perceber se era mesmo homossexual?
A.Q. - Se calhar, as duas coisas. Com 20 anos, sabemos muito pouco. Quando temos uma grande atracção por uma pessoa, quando a atracção e a admiração, e a paixão, se tornam muito intensas, duvido de que não haja uma parte física, seja qual for a pessoa. Esta coisa de nos definirmos como hetero ou homo... não me defino dessa maneira. Defino-me como uma pessoa que gosta de literatura, que gosta de música, de ciência. Deixou de ser um label[rótulo].
(...)

A.Q. - (...) O que me surpreendeu não foi ser atraído fisicamente por homens e por mulheres; foi apaixonar-me por uma pessoa, o que é diferente. Tenho alguma pena das pessoas que fazem uma separação entre o emocional e o sexual. (Agora faço essa separação, porque somos essencialmente monogâmicos, não queremos ter outras relações.) É uma pena ver duas pessoas que estão muito atraídas uma pela outra espiritualmente e que têm medo de se tocar para além da festa.
(...)

Homossexualidade, heterossexualidade e bissexualidade
(...)
Freud dizia que potencialmente somos todos bissexuais.
A.Q. - Não sei se somos.
R.Z. - Há pessoas que são totalmente heterossexuais - uma minoria - e há pessoas totalmente homossexuais - outra minoria. São poucas as que são 50/50. Sou 90% homossexual. Já tive relações, mas não seria possível manter uma relação duradoura com uma mulher.
A.Q. - É muito forte em mim esta repulsa pelas camisolas. Pertencer ao Futebol Clube do Porto ou ser do Benfica, ser católico ou ser protestante. Ou ser de Joanesburgo, sul-africano, moçambicano. O que é que eu sou? Tenho uma mãe alemã, um pai açoriano, nasci em Moçambique, vivi na África do Sul muito anos, estive na Califórnia, estou em Portugal, tenho nacionalidade portuguesa e americana. Não me faz confusão nenhuma não saber identificar-me.
(...)

Exibicionismo ou preconceito?
(...)
R.Z. - Todos os dias vejo jovens a beijarem-se em frente a toda a gente; isso também é exibicionismo? Se um casal homossexual fizesse isso, toda a gente ficava horrorizada, mas acontece todos os dias em Lisboa e no Porto e ninguém diz nada. Há um duplo standard. Sou gay, sou judeu, sou americano em Portugal. Há a tendência por parte de pessoas liberais, não-progressistas, de dizer: "Não gosto nada dos judeus, mas gosto de si." Ou: "Não gosto nada de homossexuais, mas tu és fixe." Nessas circunstâncias sou o mais judeu, o mais americano e o mais homossexual possível. Não quero ser aceitável. Quem sou eu para julgar aquele homossexual efeminado ou aquele judeu religioso, ou aquele americano que só come hambúrgueres e pizza?
(...)

Relações de longa duração
(...)
Insisto na longevidade da vossa relação, depois da turbulência dos primeiros anos. O mais difícil numa relação, independentemente da orientação sexual dos cônjuges, é estarem tanto tempo juntos e bem. Por isso as pessoas perguntam: "Qual é o segredo?"
R.Z. - Temos um bocadinho de sorte, e foi um bocadinho de trabalho. Em qualquer relação que é um verdadeiro casamento (e há casamentos que não são casamentos, são duas pessoas a viver juntas), existe a pessoa A, a pessoa B e o casamento. Há três seres vivos numa relação e tem de se ter muito cuidado com o terceiro ser vivo: o próprio casamento. Tem de se valorizar, polir, prestar atenção, senão a relação vai acabar. Os dois estamos muito conscientes disso. Apaixonarmo-nos por uma pessoa é muito fácil (com algumas pessoas que conheço, acontece de duas em duas semanas). Mas é preciso aprender a respeitar o outro. Para o Alexandre, era mais natural, tinha dois pais muito respeitosos. Eu não tinha isso. Os meus pais diziam coisas um ao outro que eu não diria ao inimigo mais feio do mundo, coisas reles. Apaixonar-me por ele era superfácil, mas respeitar a sua opinião, a sua maneira de ser, as coisas que ele dizia e com as quais não concordava, as coisas que ele fez e que não compreendi, levou-me anos.
A.Q. - Não acredito que haja relações duradouras se cada uma das pessoas não tem a sua própria vida construída. Quando o Richard está a escrever (já sei, porque escreveu vários livros), está de tal maneira obcecado com a escrita que eu sou uma espécie de audiência. E quando estou muito ocupado e ando muito cansado, ele sabe que estou a fazer qualquer coisa que para mim é importante. Nessas alturas, temos muito respeito para não exigir mais do outro. Isto aprende-se. Quando a pessoa começa a sentir uma verdadeira realização pessoal com a realização do outro, quando deixa de haver aquela necessidade egocêntrica - "preciso que me dês mais atenção porque estou inseguro" -, isso é que é uma relação conseguida.
(...)

Casar para quê?
(...)
Por que é que para si foi importante casar?
R.Z. - Simbolismo. Ainda há sítios no mundo em que ser homossexual pode ser punido com sentença de morte, com penas de dez anos, ou mais, de prisão. Para mim, como escritor, como ser humano, o facto de ser um crime exprimir o que é melhor dentro de nós, a afeição, a paixão, a solidariedade e a amizade, é inconcebivelmente injusto. É muito importante reivindicarmos os nossos direitos no Ocidente, para que um jovem que tenha acesso à Internet no Burkina Faso, na Nigéria ou na Birmânia, possa ir ao site do PÚBLICO em Portugal [e ler esta entrevista].

É também por isso que dão a entrevista?
R.Z. - Claro que sim. Vivi num mundo em que não era possível as pessoas das pequenas aldeias dos Estados Unidos assumirem-se. E em Portugal talvez ainda não seja possível em aldeias do interior. Falo disto para que aquela jovem lésbica de Castelo Branco, ou o jovem transexual de Fafe possam olhar para mim e para o Alexandre e descobrir: "Não tenho de mudar para ser aceite. Posso ser como sou. Tenho os mesmos direitos dos outros. Não há cidadãos de segunda em Portugal."
A.Q. - Pensei muito sobre se devia dar esta entrevista ou não, porque não tenho de explicar rigorosamente nada. As pessoas são aquilo que fazem e aquilo que são, e não aquilo que dizem. Há uma pequenina coisa que é muito importante: a questão dos role models. A grande diferença entre um casal heterossexual e homossexual, para já - no futuro não vai ser assim - é que os casais heterossexuais têm filhos, têm netos. No nosso caso, como não temos filhos (já pensámos adoptar, volta e meia, mas não foi uma coisa muito premente), essas relações têm de ser substituídas por outras. Temos de inventar outras partes da nossa relação que sejam alternativas a essas. Temos de nos reinventar e dar a noção a outros gays de que isso é possível, realizável. É preciso que o mundo à nossa volta perceba que não me acho especial, positiva ou negativamente, por ser assim. Tive muita sorte em encontrar uma pessoa como o Richard, tive muita sorte em ter os pais que tive, em viver nos sítios onde vivi, apesar de às vezes me sentir muito só e de ter momentos muito difíceis de afirmação pessoal. Isso também é uma história que vale a pena divulgar. Numa sociedade que está cada vez mais competitiva, é importante as pessoas falarem daquilo que não é competição selvagem. É a partilha, é sentirmos - isto parece uma treta... - que o mundo, se tivermos boa vontade e se funcionarmos de boa-fé, vale a pena.

Um conselho de moradasdedeus, vale mesmo a pena ler a entrevista.

terça-feira, 22 de janeiro de 2013

Carlo Maria Martini: palavras de um homem de escuta

Carlo Maria Martini


Por António Marujo, 1 de Setembro de 2012

O cardeal Carlo Maria Martini, o ex-arcebispo de Milão que durante vários anos foi um dos nomes mais fortes como "candidato" à sucessão de João Paulo II e que morreu esta sexta-feira, disse na sua última entrevista que a Igreja Católica está "200 anos atrasada" em relação ao tempo presente.


A edição deste sábado do jornal Corriere della Sera divulga aquela que foi a última entrevista do cardeal, que há dez anos sofria de Parkinson. Na conversa, gravada no mês de Agosto, o cardeal diz que "a Igreja está cansada... e os nossos lugares de oração estão vazios". E acrescenta, de acordo com a BBC, que a Igreja deve reconhecer os seus erros e escolher um caminho de mudança, a começar pelo Papa.

Martini morreu esta sexta-feira ao princípio da tarde, horas depois de a diocese de Milão ter anunciado o agravamento do seu estado de saúde. Foi o actual arcebispo de Milão, o cardeal Angelo Scola, quem deu a notícia da morte do eminente intelectual e especialista da Bíblia, que defendia uma atitude da Igreja mais aberta e compreensiva do mundo contemporâneo.

O cardeal escreveu dezenas de livros e textos, traduzidos em muitas línguas (vários deles em português), entre os quais "Em Que Crê Quem Não Crê" (ed. Gráfica de Coimbra), um diálogo com o filósofo Umberto Eco. Num dos últimos, "Colóquios Nocturnos em Jerusalém" (ed. Gráfica de Coimbra), diz: “"Sim, desejo uma Igreja aberta, uma Igreja cujas portas estejam abertas à juventude, uma Igreja com horizontes vastos. A Igreja não se tornará atraente por adaptações ou por ofertas tíbias. Eu confio na palavra radical de Jesus, nessa palavra que temos que traduzir para o nosso mundo como ajuda para a vida, como Boa Nova que Jesus quer trazer."


Na entrevista publicada pelo Corriere della Sera, Martini – cujo funeral se realiza segunda-feira – dizia, referindo-se ao catolicismo: "A nossa cultura envelheceu, as nossas igrejas são grandes e estão vazias e a burocracia aumenta, os nossos ritos religiosos e as vestes que usamos são pomposos."

Apesar de ter sido sempre crítico de várias posições oficiais da Igreja, Martini era muito respeitado na instituição católica. A sua inteligência e brilhantismo, a que aliava a forma subtil de manifestar as suas posições, não seriam estranhos a esse facto. Quer João Paulo II, que o nomeou para Milão em 1980, quer o actual Papa, com quem se encontrou em Junho, sempre confessaram a sua admiração pelo cardeal.


A Rádio Vaticana, conta a agência Ecclesia, recordou esse último encontro entre o Papa e o seu "amigo jesuíta" – Martini integrava esta ordem. O cardeal admitiu, já nessa altura, que se vive "um momento muito difícil para a Igreja".

Nesta manhã de sábado, Bento XVI enviou um telegrama ao cardeal Scola, manifestando a sua tristeza pela notícia da morte e acrescentando que Martini realizou um "competente e fervoroso serviço" à divulgação da Bíblia, "abrindo cada vez mais a comunidade eclesial aos tesouros da Sagrada Escritura".

Afastamento das pessoas

Outra das críticas que Martini fazia era a aspectos da encíclica Humanae Vitae, sobre a regulação dos nascimentos, na qual se fixa a ideia de que a Igreja não admite o uso do preservativo. Esse documento, de Julho de 1968, levara "ao afastamento de muitas pessoas", dizia Martini, que defendia que o preservativo pode ser usado como um "mal menor".


Na entrevista agora publicada pelo jornal italiano, dada a um padre jesuíta, o cardeal disse ainda que, a menos que a Igreja adopte uma atitude mais acolhedora em relação às pessoas divorciadas, ela perderá as futuras gerações. A questão, acrescentava ainda, segundo a BBC, não é se os casais divorciados podem receber a comunhão na missa, mas como é que a Igreja pode ajudar as pessoas em situações familiares complexas.

Desde a manhã de hoje, milhares de pessoas passam diante do corpo do cardeal, na catedral de Milão, onde Martini foi arcebispo mais de duas décadas.

No seu último livro, sobre a figura do bispo, o cardeal diz que aquele deve ser antes de mais "íntegro, honesto, leal, capaz de não mentir nunca, paciente, misericordioso, pronto a oferecer esperança a quem sofre, mas, acima de tudo, um homem verdadeiro, capaz de ouvir a todos, mesmo não crentes, separados, divorciados e homossexuais".


O bispo, acrescenta ainda, deve estar "atento aos pobres, aos encarcerados, aos doentes, aos estrangeiros", mas também a quem é obrigado a viver fora da Igreja "como os separados, os divorciados e os homossexuais". Citado pelo La Repubblica, o cardeal acrescenta no livro: "Mesmo salvaguardando o princípio de que o matrimónio é único e indissolúvel, muitos separados e divorciados têm um novo companheiro e uma nova família com filhos. Eles devem ser ouvidos, merecem atenção, porque é como estar diante dos náufragos aos quais é preciso fazer todo o possível para que não se afoguem."

Acolhimento de homossexuais

A AFP recorda outras posições de Carlo Maria Martini, como a denúncia da "tentação" de alguns católicos em refugiar-se em novos movimentos católicos que se tomam como "valor absoluto", transformando-os em "verdadeiras ideologias".


O cardeal Martini considerava "desejável" uma "evolução" em relação ao celibato dos padres, sem que a Igreja Católica tivesse de renunciar completamente a essa disciplina. Martini foi também dos primeiros a falar da importância de um novo concílio – a magna assembleia de todos os bispos do mundo. Martini considerava que o Vaticano II, cujos 50 anos se completam este ano, estava já ultrapassado em vários aspectos.

A falta "dramática" de padres, o papel da mulher na Igreja e na sociedade, a sexualidade, as relações com os ortodoxos e o ecumenismo em geral, bem como a relação entre a democracia e as leis morais, eram temas para os quais Martini propunha novas abordagens da Igreja e a necessidade de debate num novo concílio.

Nascido em Turim, em 15 de Fevereiro de 1927, Carlo Martini era membro da Companhia de Jesus. Biblista de formação, foi designado pelo Papa Paulo VI como reitor do Instituto Bíblico, onde esteve até 1978. Desempenhou depois as mesmas funções na Universidade Pontifícia Gregoriana, até ser momeado arcebispo de Milão, a maior diocese da Europa, onde esteve durante 22 anos. Entre 1986 e 1993, foi também presidente do Conselho das Conferências Episcopais da Europa. Em 2000, recebeu o prémio Príncipe das Astúrias em Ciências Sociais.


Em Milão, entre muitas outras coisas, incentivou iniciativas de diálogo com não-crentes e de acolhimento de homossexuais. Em 2002, quando completou 75 anos e deixou a diocese, foi viver para Jerusalém. Acabou por voltar a Milão em 2008, por causa do agravamento das suas condições de saúde.

Um padre idoso citado pela AFP mas que quis manter o anonimato, anunciara também a morte de Martini aos jornalistas diante da casa dos jesuítas onde o cardeal residia, afirmando: "Era um grande homem, um grande erudito que nos deixou muitos ensinamentos e um homem de Deus."

In Público

domingo, 2 de dezembro de 2012

Uma jornalista no convento de clausura

As coisas do mundo dizem-nos tão pouco...


A vida de 27 Clarissas do Mosteiro de Santa Clara, em Monte Real, cruzou-se “por vontade de Deus”. A mais nova tem 22 anos; a mais velha 86. Em comum têm um mesmo desejo: seguir Jesus da forma mais radical que a Igreja prevê – a clausura.

Lurdes

Tem 28 anos, mas parece que o rosto parou de envelhecer aos 17, quando decidiu sair de casa para se tornar Clarissa.
Deixou a família na Guarda a braços com as perguntas dos amigos e conhecidos. “Que se passou com a Lurdes? Sofreu algum desgosto?” Dez anos depois abre as mãos, conservadas brancas pela quietude da clausura, e garante-nos que seguram o mundo. “Redondo, a girar.” Lurdes vigia-o, reza por ele.

“É feliz?” Responde, quase sem pensar, com outra pergunta: “Não se nota?” Quebrámos a hora do silêncio maior entre as 14 e as 15 horas, para conversar, a sós, na horta. “Claro que tenho saudades lá de fora. De quando ia passear. Gostava de ir à serra da Estrela. Sentia Deus naquela imensidão de terra. Mas cá dentro o mundo é maior.”

Ao jantar, Lurdes é a mais atenta de todas. Observa-nos, sorri quando cruzamos o olhar com o dela. Parece divertida com o ar deslocado e de aflição permanente típico de quem acabou de chegar.
No refeitório só há um objecto de decoração – um quadro da Última Ceia de proporções consideráveis. As mesas e as cadeiras, dispostas em rectângulo, ocupam quase toda a sala.

A encabeçar o desenho está Maria Clara, a abadessa, que, minutos depois do início da refeição, abre uma gaveta pequenina por debaixo da mesa e, surpreendentemente, retira o comando da televisão. Ao jantar assiste-se aos primeiros 15 minutos do telejornal. “As únicas notícias que interessam”, justifica. Mas afinal vêem televisão? Todas se riem da pergunta. “Claro. Para podermos rezar pelo mundo precisamos de saber o que se passa.”

Donzília

Dizem que se afastaram do mundo por tanto o amarem. Rezam, trabalham e vivem numa comunidade silenciosa, longe dos olhares e dos vícios da sociedade. Vinte e quatro horas por dia, prestam adoração ao Santíssimo Sacramento na igreja do mosteiro. Acordam a meio da noite para se revezarem em turnos que duram uma hora. Levantam-se, vestem o hábito, lutam contra o sono e percorrem os enormes corredores sem luz natural que ligam as celas à igreja.
Conhecem a geometria da casa e por isso não precisam de acender as luzes. Enquanto o resto do mundo dorme, as Clarissas caminham, silenciosas, no meio da escuridão. Na igreja, em frente ao baldaquino, ajoelham e ficam em contemplação.

Donzília é, aos 73 anos, a irmã sacristã. Toma conta da igreja quando, às seis da tarde, os fiéis começam a chegar para assistir à missa. É a única que dá a cara. O resto da comunidade habita no coro, na parte de cima da igreja, escondida dos olhares curiosos. Donzília é uma das mais antigas da casa e interpela os fiéis pedindo-lhes que façam as leituras. Rodopia à volta do padre André Batista, que é capelão da base aérea de Monte Real, prepara as hóstias, acende os candelabros.

No final da celebração apaga as velas e recolhe ao coro. As Clarissas esperam que a igreja fique vazia e, até às oito da noite, a hora do jantar, concentram-se nos breviários e desdobram-se em orações e cânticos.

Ana

É pequenina e não parece ter mais de 20 anos. Mas Ana Maria já conta 38 e chegou a Monte Real há nove. Não sabe explicar porquê. “É Ele quem nos escolhe”, diz. Nem sequer era baptizada quando, aos 23 anos, se aproximou da Igreja.

Terminou o curso de Línguas e Literaturas Clássicas na Universidade de Aveiro e quis ser baptizada. Ainda deu aulas de Português e Latim. Passou por Cascais, Serpa, Beja e Santiago do Cacém. No espaço de um mês tomou a decisão que lhe mudou a vida. E começou a procura pelas várias ordens religiosas em Portugal.

Quando encontrou o nome do Mosteiro de Santa Clara na lista, estremeceu. “Anos antes, tinha ligado para as informações à procura de um número de um amigo e, por engano, deram-me o do mosteiro.” Ligou, atendeu a irmã Maria Clara, pediu desculpa pelo engano e o episódio caiu no esquecimento. Nessa altura a vida religiosa era coisa que não lhe passava pela cabeça.

Entretanto, um colega de Latim apaixonou-se por ela. Nunca conseguiu corresponder-lhe. Um dia conheceu um advogado que lhe disse: “Ana, gosto de ti, mas não consigo tocar-te e não sei porquê.” Nunca mais se viram. Agora não tem dúvidas de que “foram sinais de Deus” a indicar-lhe o caminho.

No início queria ser missionária. “Mas quantas pessoas iria ajudar? Na clausura, pela oração, consigo interceder pela humanidade inteira”, acredita. Pouco antes de chegar a Monte Real ganhou uma bolsa para uma pós-graduação na Grécia. Mas nem isso a convenceu.

“As vocações não são nenhum bicho-de-sete-cabeças nem são histórias místicas”, explica a abadessa, Maria Clara. “São escolhas racionais e dolorosas, porque as famílias não aceitam, especialmente no primeiro momento.”

Quando Maria Fernanda decidiu abandonar a carreira do ensino, aos 22 anos, a mãe telefonou para todos os mosteiros para saber onde estava. Quando conseguiu a morada do de Monte Real, “apareceu cá, arreliada”, mas acabou por aceitar a escolha da filha. “E fui eu que lhe vali quando ela morreu”, recorda Maria Clara.

Maria Clara

A abadessa, eleita por voto secreto pela comunidade, faz parte do grupo inicial de quatro mulheres que acompanharam Maria Teresa, a fundadora, quando se mudou do Mosteiro do Louriçal para abrir uma nova casa em Monte Real. Tinha 19 anos e um namorado. Décadas mais tarde reencontraram-se. Ele casado, ela de hábito. “Disse-me que não me tinha esquecido, mas eu disse-lhe que não pensava voltar atrás.” Perguntou-lhe se era feliz. Ela disse que sim. “Eu sei. Percebi assim que te vi passar.” Foi a última vez que se encontraram.

Arriscamos a pergunta: e viver sem sexo, como é? “Tentamos elevar o lado espiritual. Nenhum caminho na vida é perfeito e completo. Mas aqui há uma relação espiritual com Deus que suplanta todas as dificuldades. Aliás, toda a relação de amor entre um casal suplanta a ligação física, e é isso que há com o meu marido, que é Deus”, responde. “Dizem que vivemos em clausura, mas lá fora é que se vive enclausurado. É-se escravo do trabalho, do dinheiro, de preocupações que aos nossos olhos não significam nada.”

E o próprio recolhimento tem limites. As Clarissas podem sair em caso de doença grave de um familiar e estão autorizadas a receber visitas no locutório, uma sala à entrada do mosteiro, dividida a meio por um pequeno muro. É aí que recebem também pedidos particulares de orações. Ultimamente, a maioria chega pela internet. E nenhum é recusado.

Nos 37 anos de história do mosteiro, as Clarissas deram abrigo a mulheres vítimas de violência doméstica, atenderam pedidos de ajuda desesperados a meio da noite. “Como uma mulher que se preparava para se suicidar na praia da Vieira”, recorda Maria Fernanda. Não negam esmola a quem lhes bate à porta e chegaram a dar guarida, durante nove anos, a um homem que aparentemente não tinha nada, logo a seguir ao 25 de Abril.

Quando morreu descobriu-se que era dono de vários prédios em Lisboa. Deixou-lhos em testamento, mas repudiaram o documento. Apesar disso, a comunidade não recebe qualquer subsídio da Igreja, por isso têm de trabalhar. Venderam os trabalhos de costura, até há bem pouco tempo, a uma loja em Lisboa. “Mas a crise chega a todo o lado e o acordo caiu por terra”, explica a abadessa.

A principal fonte de rendimento é a pequena hospedaria, contígua ao mosteiro. Mas o negócio é sazonal – os turistas só chegam a Monte Real no Verão, para a praia ou para as termas. Todos os meses há despesas. “Só para a Segurança Social vão mais de mil euros.”

Para poderem tratar destes assuntos, e apesar de viverem em clausura, quatro Clarissas têm autorização do Vaticano para sair quando for necessário. E gostam? A resposta é categórica: não. “Quando saio só quero voltar para casa o mais depressa possível. As coisas do mundo dizem-nos tão pouco...”

Rosa Ramos (i) / SNPC
Para saber mais sobre as clarissas:
http://www.clarissasmontereal.com/
http://clarissasmontereal.blogspot.pt/

Porque estou aqui

Sinto-me privilegiado por ter encontrado na Igreja um lugar vazio, feito à minha medida. É certo que tê-lo encontrado (ou encontrá-lo renovadamente, pois não é dado adquirido) foi também mérito da minha sede, do meu empenho, de não baixar os braços e achar, passivamente, que não seria possível. Passo a contextualizar: a comunidade onde vou à missa é pequena e acolhedora, e podia bem não o ser. Ao mesmo tempo, sentia um desejo grande de reflexão de vida cristã e encontrei um casal (heterosexual) que tinha a mesma vontade. Começámo-nos a reunir semanalmente numa pequena comunidade de oração e reflexão que, apesar de crítica, nos tem ajudado a sermos Igreja e a nela nos revermos. Paralelamente, face ao contínuo desencanto em relação a algumas posturas e pontos de vista de uma Igreja mais institucional e hierárquica, tive a graça de encontrar um grupo de cristãos homossexuais, que se reuniam com um padre regularmente, sem terem de se esconder ou de ocultar parte de si.

Sei que muitos cristãos homossexuais nunca pensaram sequer na eventualidade de existirem grupos cristãos em que se pudessem apresentar inteiros, quanto mais pensarem poder tomar parte e pôr em comum fé, questões, procuras, afectos e vidas.

Por tudo isto me sinto grato a Deus e me sinto responsável para tentar chegar a quem não teve, até agora, uma experiência tão feliz como a minha.

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