NOTA À IMPRENSA
Coordenação Nacional de Rumos Novos – Associação Homossexual Católica
Lisboa/ Portimão, 14 de novembro de 2013
A propósito da ideologia do género
Carta Pastoral da Conferência Episcopal Portuguesa
Num momento em que todo o mundo católico se debruça sobre o inquérito do Vaticano como documento preparatório do Sínodo dos Bispos, a Conferência Episcopal Portuguesa pública uma carta pastoral “A Propósito da Ideologia de Género”.
A Rumos Novos, enquanto local de partilha e acolhimento para os homossexuais católicos portugueses, não pode deixar de fraternalmente lamentar esta Carta Pastoral, que publicada nesta altura somente pode ter por objetivo condicionar as respostas dos católicos portugueses ao próprio questionário do Vaticano.
O uso de uma linguagem que esperávamos ter já visto irradiada do seio dos Bispos portugueses e a agressividade da mesma, particularmente no referente ao casamento entre pessoas do mesmo sexo, somente continua a provocar a exclusão e marginalização destes fiéis no seio da igreja e acentuar a sua ferida e sensação de não-pertença ao corpo de fiéis. Entendemos que este tipo de linguagem é contrário aos ensinamentos de Jesus Cristo, pois como bem nos lembrou S. Paulo (Gálatas 3, 28): “Não há judeu, nem grego; não há escravo nem livre; não há homem e mulher, porque TODOS sois um só em Cristo Jesus.” E ao sermos todos (heterossexuais e homossexuais) de Cristo, somos todos igualmente herdeiros segundo a promessa e esta Carta Pastoral só serve para continuar a estigmatizar, em vez de fraternalmente amar e acolher.
Entendemos igualmente que a hierarquia Católica, lendo os sinais dos tempos (de cuja leitura a frequentemente se esquece, ou então prefere um leitura passadista e ultrapassada), deverá sempre intervir na sociedade de que faz parte (sem nunca esquecer: “Dai, pois, a César o que é de César e a Deus o que é de Deus.”, Mateus 22, 22) dando o seu valioso contributo, torna-se, contudo, inadmissível que a hierarquia tente moldar a sociedade de acordo com os seus próprios parâmetros e visão, como é o caso dos comentários efetuados nesta Carta Pastoral à legislação que aprovou o casamento entre pessoas do mesmo sexo. Mais inadmissível ainda, porquanto, se trata de uma tentativa de ingerência numa esfera que não é a sua, não com o intuito de contribuir, mas de a moldar ao seu pensamento.
É verdade que o casamento entre pessoas do mesmo sexo, particularmente aquele entre fiéis homossexuais católicos, levanta uma questão crucial para a igreja, pois a sua aceitação implica uma mudança radical no modo como esta entende a sexualidade humana, toda ela, e o casamento. Infelizmente, para nós, torna-se perfeitamente claro que, mais uma vez, a Conferência Episcopal Portuguesa não está na disposição de enfrentar estas questões, apesar da abertura pastoral que o Papa Francisco tem demonstrado. E continua, antes, determinada em reafirmar vezes sem conta aquela que tem sido a posição da igreja católica, pelos menos desde o concílio de Trento, de que a orientação homossexual, incluindo o casamento entre pessoas do mesmo sexo, não é natural e deve ser combatida, como o afirmou o arcebispo Cordileone, através de um campanha forte para “catequizar os católicos sobre o casamento”, que mais não é o que pretende fazer esta Carta Pastoral.
Esta Carta Pastoral ao repetir a ideia de que são sem compromisso as uniões pecaminosas entre pessoas do mesmo sexo e manter o incitamento para que o legislador faça tudo o que estiver ao seu alcance para as tornar ilegais continua a isolar-se do futuro, como sempre esteve em relação aos métodos anticoncecionais que, como o demonstram as sondagens, são utilizados pela esmagadora maioria dos católicos.
O facto importante que esta Carta Pastoral esquece é que as uniões entre homossexuais são visíveis e públicas devido à sua própria natureza. As pessoas católicas que vivem nestas uniões, têm famílias, amigos e conhecidos que têm estado e estarão cada vez mais desligados da igreja, devido à rejeição desta em relação à orientação sexual dos seus filhos e filhas, que conhecem e amam. Os dados do abandono serão certamente bem mais graves do que os que se seguiram à condenação da contraceção por parte do Papa Paulo VI.
Esta Carta Pastoral na sua linguagem repetida e gasta mais não faz do que contribuir para que a igreja dos nossos netos e bisnetos seja uma igreja defensiva, leal, obediente, quase uma seita, uma espécie da pequena igreja de que o Papa Bento XVI falou nos seus ataques repetidos ao relativismo e à homossexualidade, bem longe da mensagem universal de Jesus Cristo.
No Rumos Novos, acreditamos que a Igreja que amamos, e a fé que professamos, pode ser bem diferente, pois cada vez mais teólogos católicos estão convencidos que a nossa teologia moral está tão cheia de incongruências e inconsistências, fundamentadas em premissas de há muito ultrapassadas, que já não serve qualquer finalidade útil.
Por isso, esta Carta Pastoral vai em contraciclo com o inquérito do Vaticano, que através da ação do Papa Francisco, começa a elencar quais as necessidades a serem realizadas e alteradas e como, com a orientação do Espírito Santo, uma forma radicalmente inclusiva de catolicismo pode finalmente emergir, pois como nos lembrou S. Paulo (Gálatas 5, 1): “Foi para a liberdade que Cristo nos libertou. Permanecei, pois, firmes, e não vos sujeiteis outra vez ao jugo da escravidão.”
Ler aqui a Carta Pastoral a propósito da ideologia do género
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