Nota: neste artigo de opinião "pornográfica" deveria ser substituída bastantes vezes por "erótica" pois, a meu ver, pornográfico é tudo o que é produzido pela "indústria do sexo" e para consumo de um determinado mercado; "erótico" não é tão restrito, é algo que estimula os sentidos e o desejo, mas que não está vocacionado para o mercado da "indústria pornográfica". Contudo, por lealdade para com a autora do texto, não fiz a substituição de um termo pelo outro, cabendo ao leitor a tarefa de discernimento.
Male nude known as Hector, David jacques Louis |
O poeta e pintor inglês William Blake afirmou que “a arte jamais poderia existir sem expor a beleza da nudez.” Desde os primórdios dos tempos a nudez pertence à arte, estando presente nos ateliês de artistas clássicos e contemporâneos, assim como está presente em todas as outras vertentes artísticas. O corpo humano é visto como uma obra de arte. E como tal é contemplado. Afinal, é uma notável composição de músculos, uma máquina que reage e funciona à base de emoções. Que sangra, que expressa. Que causa prazer para quem sente e vê, de uma desconcertante (im)perfeição.
Mas antes da admiração, há uma eterna e cansativa discussão acerca do que é arte e do que é pornografia. Discussão errada. Com isto, infelizmente, a retratação da nudez ganhou rótulos, que se tornaram mais importantes do que a própria arte.
O rapto das Sabinas, Rubens |
É estranho que algumas pessoas se escandalizem com a exposição dos órgãos genitais, alegando que é algo grotesco e que alude puramente a luxúria, mas não se importam em admirar uma imagem sensual. Ora, a simples sensualidade é tão obscena quanto a pornografia, pois revela o que não está, desperta a imaginação, usa a nudez como pano de fundo para uma ideia mais subtil, mas que seduz e convence. Pablo Picasso disse ser “a arte algo perigoso, pois é reveladora”. E não é somente uma arte pornográfica que revela.
Prometheus, Christian Griepenkerl |
A famosa escultura de David – de Michelangelo – é a mais óbvia e explícita exposição do corpo humano. É pornografia ou é arte? A pergunta soa estúpida, não? A questão é que David é uma das mais belas obras a exaltar o corpo humano. É tecnicamente bem feito, é hiper-realista, é inebriante. Uma obra espectacular incontestável do Renascimento que fala connosco por meio da nudez e muito além da nudez. Se for boa arte, o que chamará a atenção não será apenas o corpo exposto mas sim uma série de impressões e conceitos inerentes a ela. É o que acontece com o bom observador.
L'apparition, Daniel Barkley |
Adaptação para português (de Portugal) de um texto de Rejane Borges, in Obvious
Ler um texto de opinião sobre o trabalho de Egon Schiele
Boa tarde,
ResponderEliminarTambém sou um leitor assíduo da "Obvious".
Ao ler este artigo também achei que algumas vezes ficaria melhor "erotismo", "erótico" em vez de "pornografia" ou "pornográfico".
A boa arte leva a uma revelação da essência do objecto/sujeito artístico. Digo objecto/sujeito, pois nas artes performativas o "objecto" é um sujeito, que ao revelar algo criado por outro acaba por se revelar também a si mesmo. Pode haver uma óptima peça escrita ou coreografada, no entanto uma boa apresentação... já se sabe, dá-lhe um outro esplendor.
Sobre a nudez... Há que pô-la, como tudo, no lugar certo. O grotesco pode estar completamente vestido ou completamente despido. A intenção, a essência, do nu podem ser carregadas de uma beleza tremenda, revelando a transparência, a verdade, o encontro com a pureza do que somos.
Isto tem que ser feito com pudor, que não significa esconder a nudez, mas saber transmiti-la. Hoje em dia pode-se estar a perder vertiginosamente o pudor, o decoro. Estes, em boa medida, também podem revelar uma imensa carga erótica.
Isto dar-nos-ia para uma longa e boa conversa. É um tema que gosto muito, o do Corpo, da Corporeidade.
Um Abraço!
Enfim, dar-nos-ia para uma longa conversa...
Olá Paulo, muito obrigado pelo teu comentário, com o qual concordo plenamente. Enquanto artista plástico, em trabalhos mais performativos, eu próprio já usei o meu corpo nu e não vejo que a nudez tenha de ser obrigatoriamente associada à falta de pudor. Terei sido porventura precipitado no título, pois em vez de pudor deveria aparecer algo como "escrúpulos" ou "falso pudor" - refiro-me a atitudes mais falsas do que sensatas, mais moralizantes e moralistas do que éticas ou morais, mais de aparências e preconceitos do que fundadas e esclarecidas. Mais uma vez obrigado pelo teu contributo.
ResponderEliminarrio azur,
ResponderEliminarQuando não uma boa formação, a tendência é entrar num campo de moralismos (que nada têm que ver com uma boa moral, como bem dizes), levando a opiniões que vão para além do que pode ser aceite na vida humana em geral. Quando entramos no campo artístico mais ainda, por ser dado a uma amplitude de realidades muito maior.
Isto não justifica que tudo em arte seja de qualidade. Nem tudo o que tenha nu... A verdadeira medida das coisas, como digo... Nem excesso, nem defeito! A beleza muitas vezes surge da simplicidade... E quando há simplicidade, também na nudez, alcança-se uma outra verdade.
Sei que não tem muito que ver, mas há uns tempos, depois de ver o "Scope" do Rui Horta, que aborda as questões do Corpo e da nudez, de uma forma brilhante, acabei por escrever um post intitulado "Religião e Sexo, alguns apontamentos..." Deixo o link:
http://oinsecto.blogspot.com/2008/02/religio-e-sexo-alguns-apontamentos.html
Também agradeço...
Coloquei o teu link numa mensagem do blogue, espero que não te importes com isso. Se não o quiseres, avisa-me e eu retiro-o.
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