Sobre Beleza
Desde pequeno sempre me incomodou que as "imagens" e representações dos santos quase sempre roçassem um "kitch" que, de tanto se querer perfeito, suave, sereno e bonito, cai no artificial, no estereótipo e até no feio. O que é certo é que a Beleza fala de Deus e nem tudo o que "ornamenta" as nossas igrejas fala Dele.
Mas a reflexão e procura da Beleza não vem de agora, e mesmo hoje não há unanimidade em muitos temas que a ela dizem respeito. Para alimentar um pouco a fogueira, aqui vai uma pequena reflexão sobre a beleza (ou falta dela) de Cristo:
«Talvez hoje nos espante saber que uma das discussões mantidas pelos Padres da Igreja era decidir se Cristo era ou não belo. Não é uma questão menor ou fútil como, talvez, à primeira vista possamos julgar. De facto, é a própria Liturgia que continua a alimentar esse debate. Ela, por exemplo, aplica a Jesus o Salmo 45:
«O meu coração vibra com belas palavras;
vou recitar ao rei o meu poema!
A minha língua é como pena de hábil escriba.
Tu és o mais belo dos filhos dos homens!
O encanto se derramou em teus lábios!
Por isso, Deus te abençoou para sempre!» (...)
A Beleza, e a Beleza de Cristo em particular, captura o nosso coração, fere-nos intimamente, abre-nos à revelação, faz com que deixemos de pertencer a nós mesmos, obriga-nos a relativizar o que éramos, a esquecer muitas vezes a nossa pátria e a casa dos pais, atrai-nos para si. É isso que a Igreja reza no Salmo 45.
Mas ao mesmo tempo que a Liturgia utiliza amplamente o salmo também considera indispensável a luz que traz ao mistério de Cristo o drama do Servo Sofredor, descrito em Isaías 53,1-4:
«Quem acreditou no nosso anúncio?
A quem foi revelado o braço do Senhor?
O servo cresceu diante do Senhor
como um rebento,
como raiz em terra árida,
sem figura nem beleza.
Vimo-lo sem aspeto atraente,
desprezado e abandonado pelos homens (...)»
José Tolentino Mendonça, in “Reconciliar-se com a beleza” (publicado em "O tesouro escondido")
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