William-Adolphe Bouguereau |
Nada pode afastar a ternura divina
"«Somos os filhos amados de Deus, sempre. Compreendeis então que não aceitar-se, viver descontentes e pensar de modo negativo significa não reconhecer a nossa identidade mais verdadeira? É como voltar-se para o outro lado enquanto Deus quer pousar o seu olhar sobre mim, é querer apagar o sonho que Ele tem para mim», vincou.
Nada há na história ou na personalidade de cada ser humano que possa afastar o enlaço e a ternura divinas: «Deus ama-nos assim como somos, e nenhum pecado, defeito ou erro Lhe fará mudar de ideia. Para Jesus – assim no-lo mostra o Evangelho –, ninguém é inferior e distante, ninguém é insignificante, mas todos somos prediletos e importantes: tu és importante».
«E Deus conta contigo por aquilo que és, não pelo que tens: a seus olhos, não vale mesmo nada a roupa que vestes ou o telemóvel que usas; não lhe importa se andas na moda ou não, importas-lhe tu. A seus olhos, tu vales; e o teu valor é inestimável», prosseguiu.
Por isso, vincou o papa, «Deus é fiel» no amor, «até mesmo obstinado»: «Ajudar-nos-á pensar que Ele nos ama mais do que nos amamos nós mesmos, que crê em nós mais de quanto acreditamos nós mesmos, que sempre nos apoia como o mais irredutível dos nossos fãs. Aguarda-nos sempre com esperança, mesmo quando nos fechamos nas nossas tristezas e dores, remoendo continuamente as injustiças recebidas e o passado».
«Afeiçoar-nos à tristeza, não é digno da nossa estatura espiritual. Antes pelo contrário; é um vírus que infecta e bloqueia tudo, que fecha todas as portas, que impede de reiniciar a vida, de recomeçar. Deus, por seu lado, é obstinadamente esperançoso: acredita sempre que podemos levantar-nos e não se resigna a ver-nos apagados e sem alegria», declarou.
A certeza do amor incondicional de Deus, deve configurar a existência, e para que dele não haja esquecimento ou desconsideração, Francisco sugeriu um gesto diário: «Lembremo-nos disto, no início de cada dia. Far-nos-á bem dizê-lo na oração, todas as manhãs: "Senhor, agradeço-vos porque me amais; fazei-me enamorar da minha vida". Não dos meus defeitos, que hão de ser corrigidos, mas da vida, que é um grande dom: é o tempo para amar e ser amado».
Para quem se afastou de Deus, o regresso à amizade e comunhão com Ele pode ser feito através do sacramento da Reconciliação: «Queridos jovens, não vos envergonheis de lhe levar tudo, especialmente as fraquezas, as fadigas e os pecados na Confissão: Ele saberá surpreender-vos com o seu perdão e a sua paz».
«Não tenhais medo de lhe dizer "sim" com todo o entusiasmo do coração, de lhe responder generosamente, de o seguir. Não vos deixeis anestesiar a alma, mas apostai no amor formoso, que requer também a renúncia, e um "não" forte ao doping do sucesso a todo o custo e à droga de pensar só em si mesmo e nas próprias comodidades», apelou.
A proximidade com Deus e a transformação pessoal dela resultante refletem-se depois em gestos concretos numa sociedade descrente e cética: «Poderão considerar-vos sonhadores, porque acreditais numa humanidade nova, que não aceita o ódio entre os povos, não vê as fronteiras dos países como barreiras e guarda as suas próprias tradições, sem egoísmos nem ressentimentos».
«Não desanimeis! Com o vosso sorriso e os vossos braços abertos, pregais esperança e sois uma bênção para a única família humana, que aqui tão bem representais», apontou.
Com «o olhar de Jesus», que «não se resigna perante os fechamentos, mas procura o caminho da unidade e da comunhão» e que «não se detém nas aparências, mas vê o coração», é possível «fazer crescer outra humanidade, sem esperar louvores, mas buscando o bem por si mesmo, felizes por conservar o coração limpo e lutar pacificamente pela honestidade e a justiça».
«Não vos detenhais à superfície das coisas e desconfiai das liturgias mundanas do aparecer, da maquilhagem da alma para parecer melhor. Em vez disso, instalai bem a conexão mais estável: a de um coração que vê e transmite o bem sem se cansar. E aquela alegria que gratuitamente recebestes de Deus, gratuitamente dai-a porque muitos esperam por ela», assinalou."
Excertos da homilia do Papa Francisco nas JMJ em Cracóvia
por Rui Jorge Martins em SNPC a 31 de julho de 2016
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