A periferia está no ADN cristão
A periferia está na identidade cristã mais profunda e é um horizonte no qual a Igreja deve redescobrir-se, sublinhou na tarde desta quinta-feira o P. José Tolentino Mendonça.
(...) «Onde está o nosso irmão?» A pergunta de Deus no livro do Génesis inspirou a reflexão do biblista, dedicada a «escutar a sede das periferias». O convite do poeta e ensaísta é de «olhar de olhos bem abertos a realidade do mundo» e procurar o nosso irmão entre os pobres e últimos do mundo, não separando a «sede espiritual» da «sede literal».
Um dos critérios para perceber o que é o centro e o que é a periferia do mundo é precisamente o acesso à água, direito inalienável. Como é realçado na encíclica “Laudato si’” e acentuado por dados de organizações internacionais, mais de mil milhões de seres humanos não têm a possibilidade de fruir de água potável.
Trata-se de uma multidão literalmente sedenta, perante a qual é «urgente adotar uma autêntica conversão dos estilos de vida e de coração», que «vá em direção contrária à cultura do descarte e da desigualdade social». Enquanto que os países ricos depauperam os seus recursos, «os outros vivem no suplício», afirmou o vice-reitor da Universidade Católica.
Jesus, homem periférico
Neste contexto, «a Igreja não deve ter medo de ser profética e de meter o dedo na chaga», pelo que só pode confrontar-se com as periferias do mundo. «Um discípulo de Jesus deve sabê-lo convictamente», antes de mais porque «o próprio Jesus é um homem periférico».
Com efeito, prosseguiu o P. Tolentino Mendonça, Ele não era cidadão romano nem fazia parte da elite judaica, nasceu na periferia da Judeia, por sua vez periferia de Israel e do império romano. E é às periferias que Ele se dirige, dando dignidade aos doentes, pobres, estrangeiros e pecadores.
«A periferia está no ADN cristão, aproxima-o do seu contexto originário, mas também do seu programa. É uma chave indispensável para a sua interpretação espiritual e existencial. Em todas as épocas permanecerá para a experiência cristã o lugar privilegiado onde encontrar e reencontrar Jesus», assinalou.
Nas periferias está a vitalidade do projeto cristão
O próprio cristianismo é, pela sua natureza, uma «realidade periférica», como se pode constatar pelo facto de os centros das cidades se terem tornados polos «de atividade burocrática e comercial», bem como «uma montra do passado» para os turistas.
Ao mesmo tempo, «a vitalidade do projeto cristão joga-se nas periferias», onde «muitas vezes não há sequer a presença de uma igreja dentro de paredes e onde tudo é mais precário, rarefeito ou apenas esboçado», observou. Por isso, para a Igreja a periferia é um horizonte, e não um problema, e é onde pode sair de si mesma e redescobrir-se.
«A escolha do encontro com as periferias não é unicamente um imperativo da caridade, é uma mobilização histórica e geográfica que permite o encontro com aquilo que o cristianismo foi e com aquilo que é. Mesmo as periferias da Igreja têm sede: de serem escutadas», vincou o P. Tolentino Mendonça.
Como advertia S. João Crisóstomo, a Igreja deve evitar o «terrível cisma» entre «aquilo que separa o sacramento do altar do sacramento do irmão, aquilo que perigosamente distancia o sacramento da Eucaristia do sacramento do pobre».
Periferias como lugares da alma
As periferias existenciais não são apenas económicas, e «sabemos todos como entre nós e quem está ao nosso lado há muitas vezes distâncias infinitas a abraçar e combater». Por isso a humanidade é para ser abraçada, e mesmo que não consigamos impedir as lágrima no rosto do próximo, podemos dar-lhe um lenço e dizer-lhe «estou aqui», «não estás só».
As periferias, com efeito, «não são apenas lugares físicos, são também pontos internos da nossa existência, são lugares da alma que precisam de ser pastoreados», salientou.
Michele Raviart In Vatican News
Tradução e edição em SNPC
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